Apesar dos esforços para erradicação da poliomielite, até maio deste ano foram registrados 237 casos da doença no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Desses, apenas 52 foram registrados em países considerados endêmicos na África e na Ásia. Os números explicam a grande mobilização em torno da vacinação contra a poliomielite. No Brasil, país onde a erradicação da doença foi certificada pela OMS em 1994, há mais de 20 anos não há registro de casos. O sucesso é resultado das campanhas realizadas desde 1980 no país, que garantem 95% de cobertura vacinal anualmente em crianças de até cinco anos de idade.
Neste sábado, dia 12 de junho, será realizada a primeira etapa da campanha nacional de vacinação contra a paralisia infantil. O pesquisador Edson Elias, chefe do Laboratório de Enterovírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), referência internacional para o tema, explica os reais perigos da reintrodução do vírus e reforça a importância da imunização.
O último caso de poliomielite no Brasil foi registrado em 1989. Por que a vacinação ainda é tão importante?
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Enquanto forem registrados casos da doença no mundo, a vacinação precisa continuar sendo realizada. Existem países como Índia, Afeganistão, Nigéria e Paquistão que não conseguiram erradicar a poliomielite e que podem exportar o poliovírus selvagem para outros territórios antes considerados livres da doença.
Outro aspecto está relacionado com o vírus vacinal. A vacina ministrada no Brasil e em grande parte do mundo é produzida com base no vírus vivo atenuado. Ao se replicar, ele pode sofrer mutações e, se tiver a oportunidade de circular em comunidades sem cobertura vacinal adequada, pode causar surtos da doença em pessoas que não foram imunizadas. Por isso é importante que os pais continuem levando os filhos menores de 5 anos para vacinar. Com a cobertura vacinal ampla, não existe o risco de uma pessoa não vacinada contrair o vírus.
No caso da exportação de casos, como o vírus se dissemina no ambiente?
A paralisia é o sinal mais visível de infecção pelo poliovírus. Porém, menos de 1% das infecções resultam em sintomas de paralisia. De 5% a 10% das infecções resultam em casos de meningite. O restante envolve sintomas gripais comuns a outras infecções virais - febre, dor de garganta, dor abdominal e vômito. Por isso, o poliovírus pode se espalhar rapidamente, sem ser percebido. Após a infecção inicial, ele é eliminado intermitentemente nas fezes durante várias semanas.
E em relação às mutações sofridas pelo vírus vacinal, existem casos registrados?
No ano de 2000, ocorreu um surto no Haiti e República Dominicana, com mais de 20 casos paralíticos. Ao se isolar o vírus responsável, foi constatado que se tratava do vírus da vacina muito modificado, que readquiriu algumas características de neurovirulência.
Depois de imunizado, o indivíduo excreta o vírus atenuado já com algumas mutações. Neste aspecto, podemos pensar que é perigoso disseminar o vírus vacinal. No entanto, ele só terá capacidade de voltar a infectar em locais onde a cobertura vacinal não é adequada. Uma coisa depende da outra. No Brasil não há registro de casos deste tipo.
Qual a atual situação do Brasil quanto à adesão a campanhas anuais? Existe dificuldade de alcançar a meta de 95% de cobertura vacinal em crianças menores de 5 anos?
A população continua colaborando e as taxas de cobertura são elevadas. O modelo de vacinação, controle epidemiológico e laboratorial brasileiro serviu de exemplo para que a OMS estabelecesse a meta de erradicação da poliomielite em outros países.
Como o trabalho de vigilância é realizado no laboratório?
Atuamos no monitoramento da circulação do vírus e no desenvolvimento de testes laboratoriais. O Laboratório de Enterovírus do IOC é referência nacional e internacional para o tema. Em 1986, foi detectado um surto de poliomielite no Nordeste causado pelo sorotipo 3 do vírus. Com base nos trabalhos realizados no Brasil, a vacina foi reformulada e adotada pela OMS. Em 1991, diagnosticamos o último caso de poliomielite no continente americano, registrado no Peru. Três anos depois, o continente foi o primeiro a receber a certificação de erradicação da doença.