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A batalha pelo registro de domínios no Brasil

(TheIndustryStandard)
19 jul 2001 às 11:30

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Ninguém, em sã consciência, despreza uma receita anual de 23 milhões de reais. Essa soma, avaliada por baixo, é o quanto movimenta a atividade de registro de domínios no Brasil e cuja destinação não está bem clara. Uma dinheirama dessa atrai olhos cobiçosos de todos os lados e começa a provocar jogo político que envolve o Comitê Gestor, entidade governamental responsável pela internet no Brasil, criado em 1995, e forças da iniciativa privada, que desejam também morder, de alguma forma, um pedaço do bolo.

No centro do ringue montado – e desejosa para sair dele – está a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). A fundação tem sido a responsável por registrar, credenciar e administrar os endereços de internet com terminação .br. Mas essa incumbência não vai durar até o final do ano. "Não temos interesse em continuar realizando esse tipo de serviço", revela Frederico Neves, responsável pelo registro de domínios na Fapesp.

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A saída da fundação é um fato. Primeiro porque a própria lei nº 5.918, de 1960, que a criou, proíbe que ela "assuma encargos externos permanentes de qualquer natureza". No site do Comitê Gestor, essa tarefa estava delegada à Fapesp até o final do mês de junho deste ano. O comitê já encaminhou para avaliação dos ministérios da Comunicação, Ciência e Tecnologia, Desenvolvimento e para a Anatel proposta de criação de uma sociedade civil sem fins lucrativos para se responsabilizar pela administração dos domínios de primeiro nível (Top Level Domains, TLD) no Brasil.

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A criação de uma ONG (organização não-governamental) para cuidar dessa tarefa é polêmica, mesmo antes de aprovada. Quais os critérios adotados para a sua formação? Quem serão seus dirigentes? Como será comprovada a administração de verbas? Em suma, com quem ficará o dinheiro e como ele será aplicado? O interesse comercial salta aos olhos e, como se trata de uma concessão a ser dada pelo governo, a sociedade precisa saber como será conduzido o processo.

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Parece mesmo estranho que só agora a Fapesp queira abdicar do dinheiro que vem dos registros de endereços de internet no Brasil. É verdade que a função de registrar e administrar os nomes de domínios foi-lhe atribuída quase por falta de opção. Quando a internet deixou de ser uma rede eminentemente acadêmica e tornou-se aberta para a iniciativa privada, em 1995, a Fapesp era uma das únicas instituições no Brasil com profissionais técnicos, aptos a realizar esse trabalho.


O tempo passou, a internet comercial explodiu, o número de domínios alcança hoje o degrau dos 400 mil e a Fapesp continuou responsável pela tarefa, longe dos atributos que definem sua missão institucional. A qualidade da prestação dos serviços não acompanhou o aumento da demanda e a falta de interesses comerciais leva à sua deterioração, tornando burocrático e lento o processo de inscrição.

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Quem alguma vez viveu a experiência de registrar um domínio internacional .com, por exemplo, fica realmente surpreso com a morosidade do mesmo processo no Brasil. Lá fora é possível requisitar um domínio genérico em poucos minutos, usando apenas o browser, com simplicidade e sem burocracias. Dependendo da empresa de hospedagem, já é possível começar a construção do site na mesma hora. No Brasil, os domínios com.br só são oferecidos para empresas. É necessário usar o CNPJ e ter com antecedência dois números de servidores de DNS (Domain Name Server) fornecidos por algum provedor. O processo pode levar dias.


Em meados de junho, o número de domínios .com.br era de 367.254, representando 92,37% de todos os endereços do território virtual brasileiro. No total, incluindo todos os tipos de endereços (inclusive o de profissões e pessoas físicas) eram 397.605. Os números podem dar noção da receita gerada. Até o meio do ano, o Comitê Gestor teve a possibilidade de arrecadar aproximadamente 16 milhões de reais, só com a cobrança da taxa de manutenção anual de 40 reais, sem contar com as novas taxas de inscrições. Até o final do ano, mais de 7 milhões de reais serão coletados com novos registros, considerando a média de 17 mil pedidos mensais, inscrição de 40 reais e taxa de manutenção de 40 reais. Por baixo, o negócio gera anualmente 23 milhões de reais.

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De toda essa receita, a Fapesp só recebe uma "ajuda de custo" de cerca de 720 mil reais anuais (60 mil reais por mês). E o resto? Bem, a "sobra" fica com o Comitê Gestor. "Atualmente, temos cerca de 15 milhões de reais em caixa", revela Ivan Moura Campos, coordenador do órgão. Segundo ele, esse dinheiro será usado para a construção da sede da entidade e como provisão para o desenvolvimento e instalação do Latinic, uma espécie de Internic latino-americano, que deve concentrar no futuro novos blocos de DNS. Não há informação sobre onde foram aplicados os recursos dos anos anteriores.


A saída da Fapesp do negócio levanta a discussão a respeito do modelo de exploração do serviço de registro de domínios. Ele deve ficar com o governo, que deve criar um órgão de administração para cuidar desse CPF digital? Com uma ONG sem fins lucrativos? Ou com a iniciativa privada, que extrairá seus lucros e pagará os devidos impostos?

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A questão inspira prestadores de serviço como a RegistroBrasil (ex-BulkRegisterBrasil). "Defendemos a tese que este tipo de operação deve ser responsabilidade da iniciativa privada e não de uma instituição", diz Cristiana Parada, diretora de marketing da RegistroBrasil. "A competição entre empresas vai melhorar a qualidade dos serviços e baixar os preços", argumenta.


Ela sugere um sistema semelhante ao existente nos Estados Unidos, onde atualmente a VeriSign é responsável por um registro básico único (necessário para que o sistema de domínios funcione) e cerca de 140 agentes credenciados comercializam a inscrição com os usuários finais. Modelo semelhante foi adotado no Canadá e está sugerido em consulta pública na Austrália, mas a maioria dos 254 países que possuem esses country codes ainda não fechou a questão.


"Não tem sentido a criação de despachantes oficiais de registros", opina Demi Getschko, representante da Comunidade Educacional e Cultural do Comitê Gestor. "A única solução aceitável é uma base de dados centralizada, com sua administração ligada o mais próximo possível a um organismo público".

A discussão a respeito do modelo a ser adotado deve esquentar nos próximos meses. Como se vê, o destino da internet verde-amarela dança entre os desejos corporativistas estatais e as demandas predatórias da iniciativa privada. Entre a cruz e a espada, o que a sociedade cibernética nacional exige é que as regras para a definição do modelo sejam, no mínimo, democráticas.


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