Conselhos tutelares de todo o país registraram desde 1997 no Sistema de Informação para Infância e Adolescência (Sipia) 1.002.558 violações dos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A alimentação do sistema é online e feita em tempo real, diretamente pelos conselhos tutelares. O total de violações, muda continuamente, o número indicado foi apurado no site http://portal.mj.gov.br/sipia/ na última sexta-feira (9).
Em termos absolutos, o Paraná é o estado com mais ocorrências registradas (mais de 422 mil). Roraima é o que tem menos registros (apenas 16). O registro depende da iniciativa dos conselheiros e da capacidade instalada nos conselhos tutelares.
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) orienta que os conselhos tutelares sempre façam uso do sistema no atendimento. "A ideia é o conselheiro identificar alguma forma de violação e poder, de pronto, dentro do próprio sistema, fazer o encaminhamento correspondente", explica Walisson Araújo, coordenador-geral do Sistema de Garantia dos Direitos da Secretaria de Direitos Humanos (SDH).
Leia mais:
Ibiporã continua à espera de ambulatório veterinário
Homem é preso com peixes e patas de capivara em Operação Piracema em Jaboti
Veículo de Londrina se envolve em colisão com morte em Ibaiti
Apucarana promove formatura de curso de formação em Libras
De acordo com o Sipia, a principal violação é a do direito à convivência familiar e comunitária (previsto no Artigo 16 do ECA). Mais de 467 mil ocorrências (46,66%) são relativas à falta desse direito. Além disso, o Sipia registra quase 24% de ocorrências de restrições à liberdade ou de ofensa ao respeito ou à dignidade (acima de 239 mil registros); e marca mais de 21% (acima de 212 mil registros) de desrespeito aos direitos de acesso à educação, cultura, ao esporte e lazer, obrigações do Estado.
Na semana passada, quando os registros ainda assinalavam 1.000.759 ocorrências, o perfil predominante de vítimas era do sexo masculino (53,25%) e de cor branca (62%). As ocorrências se equilibravam entre crianças de até 11 anos de idade (50,53%) e adolescentes de 12 a 18 anos (49,47%). A idade com mais registro foi de 15 anos, quase 90 mil ocorrências. Mães (256 mil registros) e pais (218 mil registros) eram, até aquele momento, os principais violadores de direitos, e a escola (46 mil registros) o local público com mais ocorrência de violações.
De acordo com Walisson Araújo, o tipo de direito violado, o perfil da vítima e dos violadores de direito não mudou desde quando o Sipia entrou no ar. "Existe aí uma rotina e constância de direitos violados e agente violador". Nesse período, "há um número muito expressivo de violações no âmbito familiar, principalmente no que se refere a castigos corporais e negligência, ao mesmo tempo em que o Estado continua sendo um grande agente violador. Apesar da universalização do ensino fundamental, ainda há registros de falta de escola e falta de informações aos pais sobre a frequência do aluno", exemplificou.
Para o ex-secretário executivo do Conanda e atual pesquisador da Universidade Católica de Brasília, Benedito dos Santos, é uma contradição social o fato de o Estado e a família, que deveriam proteger as crianças e adolescentes, serem os principais violadores de direitos.
Ele chama a atenção para a persistência do castigo físico entre as principais formas de violação de direitos das crianças e adolescentes. "Há alguma opacidade nisso, mas a agressão física passou a compor todos os rankings de violações. Em 20 anos do ECA, o Estado enfrentou pouco a violência física dentro de casa", lamenta.
Para melhorar o uso do Sipia e acabar com a subnotificação, a Secretaria dos Direitos Humanos está capacitando conselheiros de 1.990 municípios do semiárido e do programa Territórios da Cidadania.
Não há informação sobre o número exato de crianças e adolescentes que tiveram seus direitos violados. Isso porque o sistema dá prioridade às ocorrências das violações. Uma criança que é explorada sexualmente tem sua ocorrência como violação à liberdade, respeito e dignidade. Se a prática implicar o afastamento da criança da escola, o conselho tutelar também vai assinalar que a criança teve violado o seu direito à educação.
A senha de acesso ao Sipia e agendamento dos treinamentos é responsabilidade dos órgãos estaduais que lidam com a área de direitos humanos. Para localizar o contato dos administradores estaduais, os conselheiros tutelares podem ligar na SDH nos telefones (61) 2025.3961 ou 2025. 9336.