Dia 29 de julho era um domingo - o domingo é gratificante na vida delas - quando tudo mudou na breve vida da dupla Xanda e Naína. Poucos meses antes elas haviam se conhecido e há pouco haviam sentado juntas para tocar e cantar no Era Só O Que Faltava, em Curitiba, no espetáculo "Elas Tocam MPB". Nos três meses posteriores, elas são sucesso em suas apresentações dominicais. Já tem até aqueles freqüentadores que vão lá só para vê-las e já cantam junto, sabem as letras de cor até das músicas de composição própria. Já dividiram o palco e colheram elogios do Sérgio Dias - como se pode ver na entrevista com o músico -, do Jards Macalé, do Chico César, entre outros, além de toda a trupe de músicos locais. Gravaram um single e estão entrando no estúdio do mutante Sérgio Dias para a gravação do primeiro CD.
Essa parceria de duas vozes, dois violões e uma grande simpatia quase morreu, abortada na primeira vez que elas se juntaram para ver se rolava algo musical em comum. ''Tínhamos amigos em comum que nos apresentaram. A gente se encontrou e tentou um primeiro ensaio, mas não rolou e gente deixou quieto", conta Naína, a mais nova das duas, com apenas 18 anos e uma voz potente e até certo ponto ainda indomada, quase infantil na sua precisa afinação. Mas, felizmente, elas não desistiram.
"Um dia a Naína me ligou para ver se eu podia substituí-la em uma festa de formatura. Eu estava precisando de dinheiro e fui cantar", conta Xanda, 22 anos, um toque sensível de violão e uma voz de veludo. Ela continua: "Numa noite depois disso fui ver a Naína cantar num bar do Largo da Ordem e acabei dando uma canja, então vimos que a coisa podia rolar".
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E a coisa rolou mesmo. No primeiro ensaio, já saiu a primeira música: "Samba da Nêga", que conta a história de uma mulher sofrida, que apanha todos os dias e perdeu o homem pra Nêga, que ainda ficou com o nome da música. As composições, desde então, não pararam mais. Já possuem mais de 30 composições em parceria. "Mas só umas 25 que prestam", contam, com humildade.
''Comecei a compor depois, mas a Xanda já tinha um monte de música boa", conta Naína. Verdade, pois Xanda fez suas primeiras composições aos 16 anos - "mas só lá pelos 17, 18 anos é que elas começaram a ficar boas". Ela começou tocando violão em casa, com os pais. Era quase só MPB no começo, mas depois vieram Beatles, Rolling Stones, The Who, por influência do irmão mais velho. Foi convidada e topou tocar em barzinhos. Fechava o show do Ivo Rodrigues, do Blindagem, no Parque Barigüi - sabe que dia da semana? Domingo. Depois, integrou o breve, mas saudoso Wasted, banda de pop-rock com nítidas influências inglesas, pela qual gravou um CD. O primeiro disco que ela comprou na vida foi um Djavan, que deu de presente para um amigo. O segundo, Rolling Stones.
Naína era atleta. Gostava de esporte e passou pelo atletismo, vôlei e até futebol. Acabou entrando no grupo de teatro da escola e foi convidada a declamar um poema do Olavo Bilac. Como arranhava um violão, teve a idéia de musicar o poema para interpretar. Foi um sucesso e ela foi convidada para montar uma banda que não deu muito certo. Passou por várias tentativas de bandas até que decidiu tocar sozinha em bares e formaturas.
Depois daquela canja e dos ensaios, as duas decidiram tocar juntas e fizeram um pequeno circuito até que surgiu a oportunidade de fazer as segundas-feiras no Era Só... Logo foram promovidas para o domingo. Um belo dia, Jards Macalé fez o show no bar e elas tocaram depois dele, que ficou, assistiu, subiu para tocar com elas e queria porque queria gravar "Outono", a música que está no single gravada por Sérgio Dias.
Foi no dia 29 de julho que tudo aconteceu. Sérgio Dias estava na cidade e foi ao bar. Quando elas souberam que ele estava lá, tocaram "Fuga nº 2", oferecendo-a para ele. O músico acabou o jantar e foi andando para o palco em direção delas, subiu , agradeceu a homenagem e pediu para que elas tocassem e cantassem "El Justiciero". Gostou, tocou mais umas sete músicas com elas antes de descer do palco. O show continuou e no final Dias voltou a subir e tocar mais umas dez músicas.
"Ele foi o último a sair do bar, com a mulher dele, a Lurdes. Quis saber um monte de coisas sobre músicas e perguntou porque não gravávamos um CD", explica Xanda. "Disse que adoraria, mas era difícil e tal..." Na quarta-feira seguinte, as duas foram ao show de Dias, no John Bull, e ele as convidou para ir a São Paulo gravar um single. Elas aceitaram na hora, é claro. O dono do Era Só o Que Faltava, Odilon Merlin, deu as passagens de avião. Aqui, um parênteses para falar de Odilon, que também foi dono da loja de discos Temptation e que, numa iniciativa corajosa, regravou e lançou quase todos os discos dos Mutantes. Foi ele um dos responsáveis pela volta à tona desse grande grupo.
Em São Paulo, mais que uma simples gravação, o encontro de um fim de semana com Sérgio Dias, família e músicos foi uma terapia musical. ''Nunca mais fui a mesma. Agora tenho outra visão de música, de mundo de sucesso, de valores...", conta Xanda, com o apoio de Naína. "Ele tem o dom de tirar da gente sentimentos profundos", completam.
O domingo que estavam lá era de Dia dos Pais. Elas compraram um buquê de flores para Sérgio Dias, que passou a ser o pai musical da dupla. O resto, bom, o resto ainda está por vir, pois elas estão em São Paulo, gravando o primeiro CD.