Vou a uma das raras bancas de jornais e revistas de Londrina. Gosto de garimpar, de ficar olhando os títulos. Muitas vezes, nada compro. Mas há casos em que encontro promoção de alguma revista que oferece CDs, livros ou outras coisas acoplados à última edição.
Enquanto passo os olhos pelos inúmeros títulos, entra uma mulher, aparenta uns 35 anos, está de cabelos escovados e vestido florido. Com ela, um guri de uns seis ou sete anos de idade.
A mulher começa a folhear revistas de fofoca, destas que falam de subcelebridades e que tratam as novelas da TV como se fossem a vida real.
O garoto vai para a estante, mais baixa, onde estão os gibis. Os olhos do pequeno brilham. Ele pega um do Cebolinha e vai mostrar para a mãe.
- Olha, mãe, é do Cebolinha. Posso levar?
Daí vem a resposta da mulher, para a minha surpresa.
- Não vai levar coisa nenhuma. Guarda isso aí e fica quieto.
Os olhos do menino ficam cheios de lágrimas. Ele devolve a revistinha à prateleira. Diante da cena, penso em comprar o gibi e dar a ele como presente. Mas pondero que eu não gostaria de ver um estranho se metendo na educação do meu filho. Deixo para lá, com a tristeza de ver uma mãe negando a um filho um presente educativo, bom e barato.
A moça devia ficar feliz ao ver o menino se interessando pela leitura. E incentivá-lo, claro. Tenho a absoluta certeza de que, num futuro próximo, pessoas habituadas à leitura terão muitas vantagens na vida escolar e profissional.
Ela compra uma Tititi, cuja manchete é: "Após perdão, César morre nos braços de Félix". Os dois saem, uma lágrima escorre pelo rosto do garoto.
***
Fico observando o movimento da banca. O que mais se vende não é nenhuma revista ou jornal. São as apostas do jogo do bicho, feitas pessoalmente ou por telefone e registradas numa destas maquininhas semelhantes às de cartão de crédito.
Quando eu era criança, na minha inocência, imaginava que simplesmente se escolhia um dos bichos e se apostava nele. Depois alguém girava uma roleta e, no bicho que ela parasse, seria o resultado do dia. Todos que tivessem apostado no tal bicho, ganhavam.
Eu também ficava tentando entender o que os sonhos tinham a ver com os bichos. Escutava as vizinhas lá da minha rua conversando com o senhor que passava fazendo as apostas.
- Sonhei com a minha tia, que não vejo faz anos.
- Ah! Então é cabra. Parente distante sempre é cabra.
Para qualquer sonho, ele tinha, sem titubear, um bicho correspondente. Segundo as vizinhas, não falhava. Minha mãe não jogava, por isso não sabia me explicar o funcionamento da coisa.
Mas o jogo do bicho não é simples assim. Ouço os homens falando em dezena, centena, milhar. Certa vez, uma amiga me perguntou qual era a diferença entre apostar seco e molhado. Como não entendo patavina, respondi que o molhado era só para os dias chuvosos. Depois tive que explicar que era brincadeira.
O fato é que o tal jogo é considerado contravenção, mas todo mundo joga. Já vi até policial fardado fazendo uma fezinha nos bichinhos. O governo faz vista grossa, ninguém sabe ao certo para onde vai a grana. Só o que se sabe é que os prêmios são pagos com rigorosa exatidão e que gente graúda controla o negócio.
O jogo do bicho é a cara do Brasil.