Perfil
De profissional de marketing e TI na Alemanha a padeiro em Londrina, Jacob Ketterer aposta em detalhes, faz diferente e cativa clientes
Entrevistar Jacob Ketterer é tarefa que exige tempo. Ele é destes que gostam tanto da profissão que exercem a ponto de discorrer longamente sobre o ofício, com brilho nos olhos. Para este perfil, foram mais de duas horas de conversa.
Nascido em Munique, na Alemanha, o empresário de 34 anos veio parar em Londrina por razões do coração. Em 2003, ele conheceu a londrinense Karen, que partira para território germânico com a finalidade de se aprofundar nos conhecimentos musicais.
Namoraram, ela teve que voltar para o Brasil, o namoro terminou. Mas ele percebeu que gostava para valer da moça e, sete meses depois, veio atrás para pedi-la em casamento. Pedido aceito, casaram-se em 2004 e foram viver na Alemanha, onde ele trabalhava na área de marketing e TI.
Em 2011, já com dois filhos, precisavam respirar novos ares. Decidiram que era o momento de morar no Brasil. Karen voltou para a sua terra e Jacob se tornou mais um imigrante a justificar o trecho "Londrina, cidade de braços abertos...", do hino do município, escrito por Francisco Pereira Almeida Júnior e musicado por Andrea Nuzzi.
No período de adaptação à nova terra, à nova cultura e na intensificação do aprendizado do português, Jacob passou a se dedicar a uma paixão antiga: a culinária. Nunca havia trabalhado profissionalmente com isso, mas sempre gostou de cozinhar.
"Na Alemanha, no forno a lenha da casa da minha família, eu costumava fazer pães. Sempre tive paixão por comida, paladar. Então, já em Londrina, li um livro de culinária de pães que possuía e comecei a fazer em casa mesmo. O pessoal gostou e começou a encomendar. Primeiro a família, depois os moradores do prédio em que residimos. Quando vi, estava passando 14 horas por dia na cozinha", rememora.
O hobby já se tornara profissão. Ele foi atrás de saber mais. Matriculou-se em curso de padeiro e confeiteiro do Senai, comprou mais livros sobre panificação. "Queria aprender tudo. Da pré-produção à embalagem. Teve livro que li dez vezes", conta Jacob.
Achando que ainda não era suficiente, foi à Alemanha fazer curso na academia de padeiros daquele país. Cinco semanas, doze horas por dia. "Pão, basicamente é feito de farinha, água, sal e leveduras. Parece simples, mas não é. Para que fique muito bom, o padeiro tem que ler a massa, entender o que ela quer. Há ciência na panificação. É um trabalho artesanal e que precisa ser bem feito todos os dias", destaca.
E quando achou que já sabia o necessário para fazer ótimos pães, incentivado por amigos, passou a considerar a possibilidade de abrir uma padaria. Primeiro, andou pela cidade, conhecendo os estabelecimentos que já funcionavam em Londrina. Depois foi a Curitiba, Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Munique, Paris. Visitou em cada cidade o máximo de padarias possível, analisando em cada uma as coisas boas que poderia replicar na empresa que abriria.
Assim, em 15 de setembro do ano passado, a Brot –que significa pão, em alemão- abria suas portas na Avenida Duque de Caxias, com algumas diferenças que logo chamaram a atenção.
A principal é o fato de ser possível visualizar toda a produção de pães. Um vidro separa os fornos e a parte que o pessoal põe a mão na massa do salão. Quem passa pela rua também consegue assistir à produção por causa das paredes de vidro. "É para as pessoas verem que também somos artistas. E que a nossa higiene é impecável", justifica Jacob, como bom marqueteiro.
Outra particularidade é a produção artesanal, com fermentação de longa duração. Por isso, nem sempre o que é desejado pelo cliente está disponível. Segundo Jacob, um pão ali nunca demora menos de 16 horas para ser feito. E explica que não abre mão de que qualquer um de seus produtos sejam três coisas ao mesmo tempo: alemão, natural, artesanal.
A Brot inaugurou com 14 funcionários. Três semanas depois já precisava contratar mais. Hoje são 27. No processo de seleção, para o pessoal que trabalharia na produção, além de currículo, Jacob solicitava ao candidato que levasse um produto feito com as próprias mãos para a entrevista de emprego. No total, recebeu mais de três mil candidatos. "Foi difícil, porque eu estava procurando pessoas com alguma qualificação técnica, mas também humildes e com bom coração."
E antes de abrir para o público, durante cinco dias recebeu apenas amigos e convidados, que podiam comer à vontade e de graça, com a única condição de terminar completamente um lanche para pedir outro. Assim foi possível corrigir muitos erros antes de começar a receber os clientes.
Atualmente, os fregueses giram entre 600 e mil por dia. Reformas estão sendo feitas no prédio para otimizar o espaço e possibilitar o aumento da produção. Entre os 25 tipos de pães produzidos, os campeões de vendas são o francês, naturalmente, e o pão preto, que leva centeio integral, aveia, trigo, sementes de abóbora e de girassol. Entre os dez doces do cardápio, lidera o apfelstrudel, seguido do bolo de banana.
Na página da Brot no Facebook, que tinha mais de 4,5 mil curtidas até o fechamento desta reportagem, 76 pessoas haviam avaliado a empresa. Dessa, 74 deram cinco estrelas, a nota máxima. Uma deu duas estrelas e outra apenas uma estrela.
Questionado sobre o que acha de Londrina, o alemão diz que a cidade é bonita, com um povo receptivo e com uma mistura étnica interessante. "Tem todos os povos aqui", ele se admira. De fato, se olharmos para nosso passado, dados disponíveis no Museu Histórico mostram que, entre 1933 e 1940, adquiriram lotes da Companhia de Terras Norte do Paraná 770 italianos, 638 japoneses, 554 alemães, 480 espanhóis e 309 portugueses, além de várias pessoas de diversas outras nacionalidades.
Sobre os fatos negativos, ele lamenta a burocracia que cerca aqueles que desejam empreender no município. "Tudo parece absurdamente complicado, a ponto de o investidor não se sentir bem-vindo", lamenta.
Mas os obstáculos são superados com certas alegrias que a vida proporciona. Na adolescência, torcedor do Bayern de Munique, Jacob ia ao estádio admirar o futebol do então principal jogador do time, o londrinense Élber Giovane de Souza. Para os alemães, Giovane Élber.
Dias atrás, trabalhando na padaria, ele vê chegar ao balcão ninguém menos do que o ídolo de sua adolescência. Élber foi comprar pão. "Que grande momento recebê-lo. Jamais eu poderia imaginar, quando estava torcendo nas arquibancadas, que um dia isso iria acontecer".
Londrina às vezes faz o mundo parecer muito pequeno. E Jacob já está com os pés vermelhos. A cidade ganhou mais um empreendedor, que tem planos de crescer.