Certa vez, ao se ver diante de um simples pescador, provavelmente na Bahia, Vinicius de Moraes, já poeta, compositor e músico consagrado, olhou para Toquinho, o companheiro de muitas jornadas, e disse: "Não sei absolutamente nada da vida perto de uma pessoa assim."
Toquinho contou essa história em matéria que escreveu especialmente para o jornal O Estado de São Paulo, por ocasião do centenário do poetinha, em outubro passado.
Isso me fez lembrar que, apesar de já ter entrevistado gente como a atual presidente do Brasil - Dilma Rousseff -, governadores do Paraná, generais do exército, senadores da República, artistas milionários, apresentadores de televisão; guardo na mente e no coração as entrevistas que fiz com as pessoas mais simples.
Os entrevistados mais humildes, sem títulos ou cargos "importantes", foram os que mais me ensinaram.
Gente como Gabriel Cardoso dos Santos, que tinha 90 anos quando recebeu a mim e ao fotógrafo Fabio Ciquini com disposição de menino, no sítio que ele tocava no município de Astorga.
A propriedade leva o nome, na escritura e na placa da porteira, de "Sítio Corinthians Paulista". Mas ele não é corintiano. O nome foi ideia de um dos filhos. Gabriel acatou de bom grado. Já faz cinco anos que fomos até lá. Não sei se esse senhor agricultor ainda é vivo, mas sei que ele nos deu, em uma hora de entrevista, várias lições:
1 - Amor à profissão. Agricultor nato, cuidava da horta e da roça de milho sozinho, com enxada e alegria, apesar dos 90.
2 - De ecologia. "Tem gente que se importa de perder um pedaço da propriedade para as árvores. Eu, pelo contrário, gosto muito delas."
3 – De dedicação ao próximo. Como parteiro, ajudara, segundo seus cálculos, a mais de uma centena de mulheres a dar à luz seus rebentos.
4 – De felicidade. Naquela placa da porteira, além do nome do tal time de São Paulo, mandou escrever: "Estou no cantinho do céu, estou com Deus, estou feliz."
Além do seu Gabriel, eu poderia citar muitos e muitos outros, como o padre Haruo Sasaki, que fundou um local para tratar de gente com hanseníase, no meio do nada, em São Jerônimo da Serra.
Ou talvez o seu Generoso Nunes Pereira, um dos últimos a entregar pães, de porta em porta, com uma carrocinha de tração animal, em Londrina. Homem de riso fácil, alegre, que acordava às quatro da madrugada. Distribuía pães e alegria. Generoso, poderia haver nome mais apropriado para ele?
Paro de citar entrevistados por aqui, pois do contrário o texto ficaria tão longo que nem caberia no blog.
Conto estas histórias para expressar que tudo que é simples é bom. Pessoas, gestos, atos, comidas. Milho cozido com manteiga derretendo, café passado na hora, bolo de fubá da mãe, pão caseiro da vó, sorriso da filha, beijo carinhoso da mulher, gente que não se acha importante demais.
Hoje, tudo parece que tem de ser tão complicado. Basta ver o tanto de laudas que estamos escrevendo para chegar a alguma conclusão sobre os tais rolezinhos.
Jovens e adolescentes sempre se juntaram em turmas para passear, paquerar. Meus avós já faziam isso. No entanto, agora até o passeio dessa moçada, coisa mais comum do mundo, virou fenômeno social difícil de entender. Gera discussões e divide opiniões. Eita mundo complicado.
Deixemos de lado os supérfluos. Viva a simplicidade.