Uma pessoa morta de forma violenta a cada três dias em Londrina. Esse é o resultado de um levantamento exclusivo elaborado em parceria pelos jornais Folha de Londrina e Nosso Dia. Foram 116 casos registrados em 2016, em uma lista que inclui homicídios, latrocínios (roubo seguido de morte), casos de lesão corporal e confrontos com a polícia. Mais de um quarto das mortes violentas pode ser resultado de ação policial. Além de 20 situações apontadas como confrontos - sendo 18 envolvendo policiais militares, uma um policial civil e outra um guarda municipal -, outros 11 casos de homicídios, que têm policiais como suspeitos, são alvo de processos no Ministério Público. O levantamento não inclui vítimas de acidentes.
Entre a noite de sexta-feira e a madrugada de sábado (29 e 30 de janeiro de 2016), 12 pessoas foram mortas (incluindo uma em Ibiporã) e outras 14 ficaram feridas em atentados realizados em oito pontos das zonas norte, leste e oeste da cidade, após o assassinato do soldado Cristiano Luiz Bottino, na zona norte. A suspeita é de uma retaliação por parte de um grupo de policiais e outros suspeitos. O Ministério Público investiga ainda outros homicídios registrados no início de 2016 que podem estar ligados à chacina. Nesta segunda-feira (30), exatamente um ano depois do ocorrido, nenhum dos 17 inquéritos, que foram divididos por situações e locais, foi concluído.
O promotor Ricardo Alves Domingues cobra celeridade da Polícia Civil. "Pela demora, é possível perceber que não tem sido dado o tratamento que a urgência desse caso demandaria", comenta. Ele menciona que, à época, uma força-tarefa com um delegado exclusivo para a investigação do caso foi montada. No entanto, desde o final de junho, quando o delegado responsável foi deslocado para a Força Nacional, as investigações voltaram à Delegacia de Homicídios de Londrina. "Houve uma dissolução da força-tarefa e, desde então, os avanços nas investigações foram mínimos", diz.
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Seis policiais militares chegaram a ser presos, mas foram colocados em liberdade. A defesa dos policiais sustenta que as mortes foram causadas por uma guerra de gangues. O coordenador da Comissão dos Direitos Humanos (CDH) em Londrina, Carlos Enrique Santana, defende os policiais. "As autoridades fizeram uma ação de pirotecnia para dizer que deram uma resposta, vilipendiando o direito desses militares, sem provas concretas. O fato é que seguimos sem uma resposta do que realmente ocorreu", diz. Já o Ministério Público alega que houve destruição de provas por parte dos policiais suspeitos pelas mortes.
O delegado-chefe da 10ª Subdivisão Policial, Sebastião Ramos dos Santos Neto, informa que encaminhou um ofício ao promotor e garante que avanços ocorreram nos últimos dias. "Alguns casos dependem de perícias, mas conseguimos sanear a maioria dos inquéritos que, em breve, devem ser encaminhados ao Ministério Público", promete.
Confira detalhes do mapa das mortes violentas em Londrina abaixo:
Janeiro, o mês da chacina, foi o mais violento de 2016, com 26 mortes, seguido por dezembro (21) e novembro (14). Domingo concentrou a maior quantidade de mortes (29). Os dados apontam ainda que 20 pessoas foram mortas na terça-feira; 18 no sábado e 15 na sexta-feira. A maioria dos casos ocorreu durante a noite (45) ou de madrugada (32). Mas 32 ocorrências foram registradas em plena luz do dia, sendo 18 durante a tarde e 13 pela manhã.
Mais de um terço das mortes violentas ocorreu na zona norte (42), mais recorrentes em bairros como Novo Amparo, Violin, Vivi Xavier e Santiago. A zona leste aparece em seguida com 27 mortes, a maioria nos jardins Monte Cristo e Marabá. Na zona sul foram 25 mortes, com prevalência no União da Vitória, Cristal, Franciscato e Cafezal. A zona oeste concentrou 12 casos, seguida pela região central, onde 10 pessoas foram mortas.
Santos Neto chama a atenção para o aumento da violência na cidade. "Principalmente nos últimos meses do ano, os homicídios se tornaram mais violentos, com vários tiros, utilização de armas de grosso calibre", pontua. Segundo ele, grande parte dos crimes pode ter relação com quadrilhas de tráfico de drogas. "Há uma conotação típica de envolvimento do tráfico. Muitas das vítimas tinham antecedentes criminais, o que, claro, não justifica o assassinato", comenta.
Das 116 pessoas que morreram de forma violenta, 100 foram por arma de fogo, nove esfaqueadas, quatro por espancamento, uma por asfixia e outros dois casos ainda seriam investigados. Na lista de mortos, os homens são maioria absoluta: 118 contra oito mulheres. No quesito faixa etária, os jovens com idade de até 29 anos somam 58% do total. Neste contingente, estão nove adolescentes, dois de 14 anos.
Os números diferem dos dados oficiais, que não computam casos de confrontos e de mortes posteriores, ocorridas em unidades de saúde. A Secretaria de Estado da Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp) ainda não fechou o relatório estatístico de 2016. O documento mais recente do órgão aponta 49 homicídios em Londrina até o terceiro trimestre do ano passado, 10 a menos que o levantamento do Grupo Folha, excetuando-se os confrontos. Casos de latrocínios como o da aposentada Alice Capellari, de 66 anos, assassinada em janeiro de 2016, na Avenida Bandeirantes (área central) ou o do comerciante Joel de Paula, em setembro, na zona norte, não constam no relatório.
O delegado-chefe admite que as estatísticas podem conter inconsistências pontuais, que devem ser corrigidas na versão final do relatório. Pelo sistema, o boletim de ocorrência do comerciante foi enquadrado como "homicídio qualificado" e o da aposentada, como "morte a apurar; indícios de crime". "O latrocínio foi investigado e os responsáveis foram rapidamente presos, mas como os dados são transmitidos pelo sistema computadorizado, um campo mal preenchido pode gerar essas inconsistências", diz o delegado.
Por meio de nota, a Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp) informa que não reconhece como oficiais os números apresentados na reportagem. Segundo o órgão, os dados estatísticos referentes ao ano de 2016 em todo o Paraná, elaborados pela Coordenadoria de Análise e Planejamento Estratégico (Cape), serão apresentados nas próximas semanas.