''A gente percebe que falam bastante, mas esperamos que façam também''. Os votos da auxiliar de enfermagem Edna Regina Camilo, há 11 anos trabalhando na Fiação de Seda Bratac, traduzem a expectativa dos outros 450 funcionários em relação às autoridades que estiveram na empresa nesta quarta-feira para discutir o grave quadro de violência que se instalou na zona oeste de Londrina.
O encontro reuniu, pela manhã, dirigentes locais e nacionais da Bratac, o prefeito Nedson Micheleti (PT), o delegado-chefe da 10ª Subdvisão Policial, Jurandir Gonçalves André, deputados estaduais, vereadores e representantes de entidades do município. A empresa está encravada entre bairros que abrigam gangues rivais: os jardins Nossa Senhora da Paz e Leste-Oeste, e a favela Pantanal.
A pior ilustração da crescente violência sofrida pela empresa - o assassinato do auxiliar de produção Damião dos Santos Ramos, de 27 anos, no final do mês passado - ganhou hoje um reforço ainda mais recente e visível: as marcas de três tiros disparados apenas seis horas antes da reunião. Uma das marcas podia ser vista exatamente atrás da bancada onde as autoridades se sentaram.
A deputada estadual Elza Correia (PMDB) usou o fato para enfatizar seu discurso. ''Se o tiroteio ocorresse agora, seríamos nós os atingidos. Qualquer um de nós pode ser o alvo'', exemplificou.
Segundo o diretor administrativo da Bratac, Hélio Mizokoshi, assaltantes tentaram forçar a entrada na empresa por volta das 2h30 e atiraram ao ouvir os gritos dos vigias. Dessa vez, ninguém ficou ferido.
Leia mais:
APP-Sindicato questiona equidade no programa Parceiro da Escola em Londrina
Prefeito de Londrina entrega título de Cidadão Honorário a Oswaldo Militão
Sarau une poesia e crônica para celebrar os 90 de Londrina nesta sexta
Anne Moraes presta depoimento após Polícia Ambiental encontrar ossadas de animais na ADA
Mas essa nova tentativa de roubo - houve outras duas neste ano, uma delas concretizada - é mais um elemento que pode levar os dirigentes da Bratac a decidirem fechar a empresa. ''Não é o que queremos, mas infelizmente pode ser necessário'', afirmou o presidente Antônio Takao Amano, que veio de São Paulo para expôr às autoridades locais o drama da fiação.
Além do clima de tensão que predomina entre os funcionários, Amano destacou os prejuízos financeiros causados pela violência. Segundo ele, já foram gastos R$ 110 mil para reparar os danos provocados por tiroteios e depredações - em junho, moradores do Jardim Nossa Senhora da Paz (zona oeste) derrubaram 70 metros de um muro da empresa em protesto contra a morte de Everton Luis, 14 anos.
Outros R$ 150 mil deverão ser empregados para reforçar a estrutura de segurança da empresa. ''São R$ 260 mil no total, valor que poderíamos usar para melhoramentos técnicos e de salários. Se tirarmos algum proveito dessa reunião, talvez possamos dispensar uma parte desse gasto'', avaliou, lembrando que a empresa está trabalhando ''no vermelho'' atualmente.
A Bratac inaugurou a filial de Londrina em 1974. Naquela época, de acordo com Amano, o local foi escolhido devido a uma fonte d'água que poderia ser utilizada pela empresa. ''Os bairros foram se formando e sem querer, acabamos ficando num lugar perigoso, no meio do fogo cruzado'', contou.
O gerente administrativo Edson Moniwa, 45 anos, 26 deles só na Bratac, também recorda a evolução da violência na região. ''Antes a gente só ouvia os tiros, de longe. Agora os tiros estão aqui'', desabafou. A tensão é compartilhada pela fiandeira Sara Silva, 22 anos, há três trabalhando na empresa. ''O pessoal tá muito amedrontado. É um bom lugar para trabalhar, só precisa de mais segurança. É o mínimo que as autoridades podem fazer por nós'', exigiu.
Representantes dos funcionários entregaram ao prefeito um abaixo-assinado com 350 assinaturas, reivindicando ações efetivas contra a violência na zona oeste. ''Queremos que façam um trabalho preventivo, 24 horas por dia, mantenham a limpeza dos matagais e continuem com os arrastões'', apontou Edna Camilo.
A limpeza dos matagais na região começou na semana passada, tendo como um dos objetivos eliminar possíveis esconderijos de criminosos. Os ''arrastões'' foram realizados pela Polícia Civil nas últimas duas semanas, nos bairros mais violentos da região, e resultaram em várias prisões e apreensões de armas.