No auge da exportação de grãos, mulheres deixam interior do estado e outras regiões portuárias brasileiras para aproveitar dinheiro de caminhoneiros e marinheiros no Paraná
A exportação da supersafra de grãos pelo Porto de Paranaguá, no Litoral do Estado, está provocando uma migração inusitada. Prostitutas vindas de diversas regiões do Paraná e também de outros Estados estão sendo atraídas pelo dinheiro movimentado no cais do porto, o segundo maior do País. Muitas são originárias de outras regiões portuárias do Brasil.
"A gente é igual a andorinha. Vai onde tem fartura", sintetiza Tainá, 21 anos, garota de programa que veio do interior do Estado para a Boca do Cais, zona de prostituição próxima ao porto. Tainá, como as demais prostitutas entrevistas pela Folha em quatro noites de apuração, não quiseram dar o nome completo, mas apenas o apelido de rua.
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Chegadas na boléia do caminhão, de carona nos navios ou de ônibus, essas mulheres buscam uma alternativa de vida, que ajude a resolver um problema urgente: a falta de dinheiro. "Aqui existe possibilidade de melhorar de vida. A gente pode ganhar dinheiro em diversos tipos de moedas, inclusive dólares", avalia Patrícia, 20 anos, que veio do Porto de Rio Grande (RS) há 25 dias.
Realmente. A cidade paranaense movimenta bastante dinheiro a cada safra. A estimativa é que a exportação de grãos gere US$ 5 bilhões em divisas para o Brasil. O setor de transportes arrecada cerca de R$ 40 milhões nesse período do ano. Desse dinheiro, R$ 8,28 milhões ficam no porto, na forma de tarifas.
Mas, conforme desce na hierarquia da economia, o dinheiro vai se diluindo. Assim, das migalhas que ficam com o setor operacional da safra -caminhoneiros, marinheiros, estivadores e operadores -, uma pequena parte acaba nas mãos das prostitutas.
Em uma viagem de Cascavel a Paranaguá, um caminhoneiro autônomo pode ganhar até R$ 800,00. Já um marinheiro fatura em torno de US$ 1 mil. "Um pouquinho do que eles (caminhoneiros) ganham enche meu bolso", avalia Neide, 36 anos, que normalmente trabalha na beira da estrada, na região de Ponta Grossa, e migrou ao Litoral nesta safra.
"Vi na televisão que tinha bastante movimento por aqui. E, como estava tudo parado no Rio Grande, por causa dos custos de exportar a safra, vim para Paranaguá, onde tem muitos marinheiros e operadores de navios", diz a gaúcha Patrícia. "A gente sabe quando tem riqueza nos portos e, por isso, vai se deslocando", narra Regina, que na última quinta-feira pegava uma carona para o Porto de Santos (SP). Com 30 anos, ela veio da cidade portuária paulista em busca do dinheiro da safra paranaense. "Volto para casa para ver meu filho, mas retorno", prometeu.
Esse movimento das prostitutas só é conhecido empiricamente. A Prefeitura de Paranaguá sabe o que acontece, mas não possui estudos que avaliem os impactos dessa migração nos portos. O processo também é desconhecido pelos governos estadual e federal.
O resultado da falta de conhecimento é que não existem programas de atendimento exclusivos para as mulheres e travestis que trabalham nas áreas de prostituição. Tudo que acontece é pontual, desenvolvido por organizações não-governamentais (Ongs). Apesar dos esforços, esses organismos não são capazes de atender tamanha demanda.
O fator mais complicado é com relação à saúde. "Sabe-se por comentários que, na época da safra, vêm prostitutas de diversas regiões do Paraná e de outros Estados, mas não se tem informação de quantas são", resume o secretário de saúde de Paranaguá, Volney Bonotto.
A falta de informação não é uma característica municipal. Quando entrevistado, o técnico responsável da Coordenação Estadual de Doenças Sexualmente Transmissíveis e Aids (DST/Aids), Francisco Carlos dos Santos, não sabia que vinham mulheres de municípios do interior paranaense, como Londrina, Maringá e Cascavel. "O trabalho da Secretaria (Estadual de Saúde) é dar estrutura para Ongs atender as profissionais do sexo. Também se procura orientar os caminhoneiros", afirma Santos.
Diante dessa falta de estrutura -seja da cidade ou dos serviços sociais estaduais-, as prostitutas vão seguindo a vida. Com a experiência de um mês de prostituição, a parnanguara Iza, 19 anos, resume: "O jeito é a gente ser esperto porque, se não, te comem vivo".