A força-tarefa da Operação Lava Jato em São Paulo denunciou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por lavagem de dinheiro. A acusação formal levada à Justiça Federal aponta que, "usufruindo de seu prestígio internacional, Lula influiu em decisões do presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, que resultaram na ampliação dos negócios do grupo brasileiro ARG no país africano".
De acordo com a Procuradoria da República, em troca, o ex-presidente recebeu R$ 1 milhão dissimulado na forma de uma doação da empresa ao Instituto Lula.
Para o Ministério Público Federal, não se trata de doação, mas de pagamento de vantagem a Lula em virtude do ex-presidente do Brasil ter influenciado o presidente de outro país no exercício de sua função. Como a doação feita pela ARG seria um pagamento, o registro do valor como uma doação é ideologicamente falso e trata-se apenas de uma dissimulação da origem do dinheiro ilícito - e, portanto, configuraria crime de lavagem de dinheiro.
Leia mais:
'Tenham orgulho da sua cidade', afirma Tiago Amaral, prefeito eleito de Londrina
‘Londrina é uma cidade impressionante’, diz prefeito Marcelo Belinati
Lula evoluiu bem à cirurgia, está estável e conversa normalmente, dizem médicos
'Presidente encontra-se bem', diz boletim médico após cirurgia de Lula
Esta é a primeira denúncia da Lava Jato São Paulo contra o ex-presidente. No Paraná, base e origem da operação, a força-tarefa da Procuradoria já levou o petista três vezes para o banco dos réus - em um processo, Lula já foi condenado a 12 anos e um mês de prisão, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso triplex.
Além de Lula, o Ministério Público Federal denunciou o controlador do grupo ARG, Rodolfo Giannetti Geo, pelos crimes de tráfico de influência em transação comercial internacional e lavagem de dinheiro.
Os fatos teriam ocorrido entre setembro de 2011 e junho de 2012, quando o petista já não era presidente. Como Lula já tem mais de 70 anos, o crime de tráfico de influência prescreveu para ele, mas não para o empresário.
A Lava Jato afirma que a transação que teria levado ao pagamento de R$ 1 milhão destinado ao Instituto Lula começou entre setembro e outubro de 2011. A Procuradoria relata que Rodolfo Giannetti Geo procurou Lula e solicitou ao ex-presidente que interviesse junto ao mandatário da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, para que o governo daquele país continuasse realizando operações comerciais com o Grupo ARG, especialmente na construção de rodovias.
"As provas do crime denunciado pelo Ministério Público Federal foram encontradas nos e-mails do Instituto Lula, apreendidos em busca e apreensão realizada no Instituto Lula em março de 2016 na Operação Aletheia, 24ª fase da Operação Lava Jato de Curitiba", informou a Lava Jato.
Os investigadores afirmam que, em um e-mail de 5 de outubro de 2011, o ex-ministro do Desenvolvimento do governo Lula Miguel Jorge escreveu para Clara Ant (diretora do Instituto Lula) que o ex-presidente havia dito a ele que gostaria de falar com Rodolfo Geo sobre o trabalho da empresa na Guiné Equatorial.
Segundo o ex-ministro informava no e-mail, a empresa estava disposta a fazer uma contribuição financeira "bastante importante" ao Instituto Lula.
Em maio de 2012, Rodolfo Geo encaminhou para Clara Ant por e-mail uma carta digitalizada de Teodoro Obiang para Lula e pediu para que fosse agendada uma data para encontrar o ex-presidente e lhe entregar a original. Também informou à diretora do Instituto Lula que voltaria à Guiné Equatorial em 20 de maio e que gostaria de levar a resposta de Lula a Obiang.
Lula escreveu uma carta datada de 21 de maio de 2012 para Obiang na qual mencionava um telefonema entre ambos e que acreditava que o país poderia ingressar, futuramente, na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. A carta foi entregue em mãos ao presidente da Guiné Equatorial por Rodolfo Geo.
Na carta assinada por Lula, ele informava a Teodoro Obiang que Rodolfo Geo dirigiu a ARG, "empresa que já desde 2007 se familiarizou com a Guiné Equatorial, destacando-se na construção de estradas".
Na análise dos dados apreendidos no Instituto Lula, segundo a Lava Jato, foi localizado registro da transferência bancária de R$ 1 milhão pela ARG ao instituto em 18 de junho de 2016. Recibo emitido pela instituição na mesma data e também apreendido na Operação registrou a "doação" do valor.
O caso envolvendo o Instituto Lula foi remetido à Justiça Federal de São Paulo por ordem do então titular da Operação Lava Jato, Sergio Moro. O inquérito tramita na 2ª Vara Federal de São Paulo, especializada em crimes financeiros e lavagem de dinheiro, que analisará a denúncia do Ministério Público Federal.
Teodoro Obiang
Teodoro é pai do vice-presidente da Guiné-Equatorial, Teodoro Nguema Obiang, o Teodorin, cuja comitiva foi retida no dia 14 de setembro no Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP). O grupo de Teodorin estava na posse de US$ 16 milhões em dinheiro vivo e relógios de luxo. A Polícia Federal e a Procuradoria da República investigam o destino que Teodorin planejava dar à fortuna.
Em outubro, a PF realizou buscas no monumental apartamento triplex de 1 mil metros quadrados, no Condomínio L'Essence, avaliado em R$ 70 milhões, localizado à Rua Hadock Lobo, nos Jardins, bairro nobre de São Paulo, cuja propriedade é atribuída a Teodorin.
Defesas
A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que a denúncia oferecida contra ele no âmbito da Lava Jato de São Paulo é "mais um duro golpe no Estado de Direito".
Mais cedo, a força-tarefa da Operação Lava Jato em São Paulo denunciou Lula por lavagem de dinheiro. A acusação formal levada à Justiça Federal aponta que, "usufruindo de seu prestígio internacional, Lula influiu em decisões do presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, que resultaram na ampliação dos negócios do grupo brasileiro ARG no país africano". Segundo a Procuradoria da República, em troca, o ex-presidente recebeu R$ 1 milhão dissimulados na forma de uma doação da empresa ao Instituto Lula.
Em nota, o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, classificou a denúncia como "mais um capítulo do 'lawfare' que vem sendo imposto a Lula desde 2016".
"A denúncia pretendeu, de forma absurda e injurídica, transformar uma doação recebida de uma empresa privada pelo Instituto Lula, devidamente contabilizada e declarada às autoridades, em tráfico internacional de influência (CP, art. 337-C) e lavagem de dinheiro (Lei n. 9.613/98, art 1º. VIII)", escreveu Zanin.
Para o advogado do ex-presidente, a acusação foi construída com base na retórica, sem apoio em qualquer conduta específica praticada por Lula.
"Lula foi privado de sua liberdade contra texto expresso da Constituição Federal porque não existe em relação a ele qualquer condenação definitiva; tampouco existe um processo justo. Lula teve, ainda, todos os seus bens bloqueados pela Justiça; busca-se com isso legitimar acusações absurdas pela ausência de meios efetivos de defesa pelo ex-presidente", afirmou.