Quem não gosta do Teenage Fanclub? Numa carreira de mais de dez anos, o grupo escocês firmou uma reputação à margem da indústria de sempre apresentar discos suaves, com melodias ganchudas e confiáveis. No dia 7 de outubro, chega às lojas americanas a coletânea "Four Thousand Seven Hundred And Sixty-Six Seconds - A Shortcut To Teenage Fanclub" (Jet Set), que já havia sido lançada no Reino Unido pela Sony no começo do ano. Edição brasileira? Pode esperar.
Ao longo de seis discos, o Teenage sempre teve o mérito de só lembrar bandas de qualidade: Beatles, Byrds, Big Star. Quando surgiram com "A Catholic Education" (1990), foram acusados de imitar Dinosaur Jr e jogados pela crítica na vala comum das bandas shoegazer.
A disposição das faixas na coletânea não obedece a ordem cronológica, o que talvez impeça o ouvinte de perceber a tímida evolução da banda: de guitarreiros indie nos primórdios ("Star Sign"), esboçaram a mutação no fracassado "Thirteen" (1993), aprofundada na obra-prima "Grand Prix" (1995), rumo a refinadas harmonias vocais, guitarras acústicas e melodias mais trabalhadas. A base de poucos acordes, que nunca chegara à microfonia, se acomodou levemente ao processo.
O núcleo da banda se resume aos cantores e compositores Norman Blake, Raymond McGinley (ambos guitarristas) e Gerard Love (baixista), escudados por trocas constantes de tecladistas e bateristas. Os três têm vozes parecidas, escrevem canções no mesmo estilo, mas raramente compõem juntos. Entre as 21 músicas de "Four Thousand...", três são inéditas – cada uma assinada solitariamente por um dos compositores. Mais democrático impossível.
Em relação a outras bandas do superestimado rock escocês, o Teenage Fanclub sempre teve as vantagens de escrever melodias realmente memoráveis, de não permitir que a melancolia tomasse conta e de ter senso de humor. Ele se manifesta em títulos de canções politicamente incorretos como "Some People Try To Fuck With You" e "Satan", ou em letras irônicas como a de "The Concept" (incluída aqui), que ironiza a paixão do personagem da canção por uma metaleira: "ela diz que vai comprar uns discos do Status Quo/ oh, yeah!/ oh, yeah!".
No geral, entretanto, a principal qualidade do Teenage Fanclub sempre foi a falta de preocupação em passar ridículo. Você se lembra da época em que falar "eu te amo" numa canção pop não era brega? Claro que não, porque você provavelmente nem era nascido. Love, McGinley e Blake não têm pudores em abordar amores perdidos, paixões não correspondidas, amizade e desilusão. Não é à toa que até homenagearam Neil Young ("Neil Jung").
Em quase oitenta minutos de música, fica até difícil pinçar destaques. Afinal, quem tem uma discografia como a do Teenage Fanclub pode jogar papéis pro alto e sortear qualquer grupo de músicas pra fazer uma coletânea – o resultado vai ser bom. Dos primeiros anos da banda, vale ressaltar "Everything Flows", já definida como a melhor música para encerrar shows de todos os tempos, a docemente repetitiva "What You Do To Me" e "Hang On", de refrão de exemplar preguiça.
Da fase de "transição", saltam aos ouvidos "About You", cantada a plenos pulmões por McGinley, e a delicada "Planets", até desembocar nas músicas de "Howdy!" (2000), o álbum mais recente. Uma delas fecha o disco, "My Uptight Life". A repetição do estribilho, que demora a morrer até o fim da faixa, fixa o conteúdo da canção (e, por tabela, o lirismo do Teenage) ao invés de irritar: "a minha vida toda/ eu me sentia tão tenso/ agora está tudo bem". Numa época em que praticamente toda a música pop (até quando feita com qualidade) versa sobre corações arrasados, ódio e frustração, cantarolar junto uma coisa dessas até limpa a alma.
O conhecedor talvez sinta falta de uma meia dúzia de músicas que poderiam ter entrado em "Four Thousand..." – este escriba particularmente gostaria de ter ouvido "Winter", "Alcoholiday" e "The Sun Shines From You". Mas, como a segunda parte do título indica, trata-se apenas de um atalho para o Teenage Fanclub. Quem vai por essa trilha dificilmente vai querer voltar.