O Rapture se filia à nova geração do rock de Nova Iorque, que voltou a ser a meca roqueira depois que os Strokes venderam os tubos. Os únicos conceitos que unem essa turma parecem ser o pouco apreço pela técnica e o gosto por pop velho, dentro do qual qualquer influência está liberada. O Radio 4 persegue o rock direcionado para as cadeiras que Gang Of Four e PiL faziam no início dos anos 80, Walkmen tenta mostrar a alegria em ser miserável de um Tom Waits, Strokes e Yeah Yeah Yeahs fazem pauleira de garagem... Já o Rapture parece ter a pretensão de englobar todas essas facetas.
Definir o estilo de música que o quarteto faz é tarefa tão árdua quanto ouvir de cabo a rabo os 47 minutos cravados que perfazem "Echoes" (Universal), disco de estréia da banda, lançado no Brasil na esteira da apresentação da banda no país, abrindo para o White Stripes no Tim Festival. As quatro faixas que abrem o CD já servem para demonstrar a forma como o grupo pretende desnortear o ouvinte.
Primeiro vem "Olio", chatinha balada que emula o Cure da primeira metade dos 80, desde os vocais chorados até as batidas eletrônicas e os efeitos datados. A seguinte, "Heaven", abre com corinho à Queen, tenta ser dançante mas logo cai em marteladas de baixo, bateria e guitarra torturantes – porque, sabe como é, se você não sabe tocar, tente parecer experimental. "Open Up Your Heart", com pianinho e timbre de baixo safrado nos anos 70, até agrada. Como um Lennon carecendo de um tiquinho de inspiração. "I Need Your Love" volta à pista, ítalo-house do mais picareta. Pronto. Por aí, você já consegue perceber que não vai entender nada.
O que poderia ser prova de versatilidade acaba virando esquizofrenia vazia, pura e simples falta de orientação. O hit "House Of Jealous Lovers", que já estourou no delicado ponto de tangência entre os públicos clubber e indie, foi o que trouxe o Rapture ao Brasil. Trata-se realmente de uma bombinha sonora, mas cuja pólvora cheira a Chemical Brothers e Prodigy – fora da pista de dança, não parece ter muita utilidade...
Na praia oitentista, a banda volta ao Cure na tensa "Killing" e progride naturalmente para o Depeche Mode ou Duran Duran em "Sister Saviour". Como o último disco dos Dandy Warhols (outro engodo) comprovava, os anos 80 estão mesmo com tudo. Pena que o Rapture não chega perto dos originais.
Além de não servir para ser tocado inteiro numa festa (a não ser que você queira dormir e resolva colocar o final da faixa-título pra espantar os visitantes), "Echoes" também não funciona para simples audição com fones de ouvido. Salvam-se a citada "Open Up Your Heart", a divertida "Love Is All", a ótima produção (que faz com que o horrendo baterista Vito Roccoforte, que abusou das atravessadas no show no Brasil, acerte todos os compassos) e o belo encarte. Mas isso tudo não vale 28 reais.
LANÇAMENTOS
Frank Jorge – "Vida de Verdade" (YBrazil/Trama)
Leitor, veja bem se você se encaixa numa dessas categorias: a) você secretamente é apaixonado pela Jovem Guarda, apesar de tirar sarro de seu pai toda vez que ele rememora a trilha sonora da juventude dele; b) você acredita que rock tem que ser bobo mesmo, letra de música, quanto mais idiota, melhor; c) de cada cinco palavras que você fala, uma é a expressão "afudê!"; d) você é tão fã de Pato Fu que compraria qualquer disco que tivesse algum suspiro da Fernanda Takai; e) você é tão fã de Los Hermanos que compraria qualquer disco que tivesse arranjos de metais assinados por Marcelo Camelo; f) você é jornalista ou colaborador da Zero, ou era jornalista ou colaborador da Bizz; g) você acha que estamos numa grande batalha contra estrangeiros malvados que querem nos vender hypes fajutos para destruir a gloriosa música brasileira, então é necessário fortalecer a qualquer custo o rock nacional. Então, vestiu alguma carapuça? Caso não, você não vai ser uma das 1.500 pessoas que vão comprar "Vida de Verdade", segundo disco-solo de Frank Jorge, ex-Graforréia Xilamôrnica. Sorte sua.
Para quem gosta de: Bidê Ou Balde, Video Hits, Jovem Guarda.
Arab Strap – "Monday At The Hug & Pint" (Matador – importado)
Este quinto álbum de estúdio da banda formada pelos escoceses Aidan Moffat e Malcolm Middleton representa um dos lados vergonhosos da Trama: mesmo tendo os direitos de distribuição do selo Matador Records no Brasil, a gravadora se nega a lançar o disco por aqui (o que, diga-se, também está fazendo com outros artistas de destaque e de outros selos, como a Sub Pop). Lançado no primeiro semestre no exterior, "Monday At The..." é o trabalho mais solar que Moffat e Middleton já lançaram. A base do grupo continua a mesma: delicadas paisagens sonoras, com batidas eletrônicas discretas, guitarras preguiçosamente dedilhadas e a voz bêbada de Moffat, declamando letras sobre amores perdidos com alguma ironia. A diferença fica nos belos arranjos de cordas e na verve dançante de algumas faixas, como as ótimas "Flirt" e "Serenade". Esta última sintetiza a lira ao mesmo tempo mórbida e hilária de Moffat: "quero que seu pé arranhe meu queixo/ me faça sangrar e deixe cicatrizes". Não pode existir coisa mais ridícula do que o adjetivo "cool" – mas aqui, até faz sentido.
Para quem gosta de: Belle & Sebastian do começo, Mogwai, Tom Waits.
NOITE INDIE
Se você estiver em Londrina, dê um pulo nessa terça-feira, dia 16, no Bar Valentino. A partir das 21 horas, este colunista vai comandar a Terça Tilt, festinha onde vai rolar o melhor do indie rock. A entrada é franca. No cardápio, iguarias como Radiohead, Pavement, Pixies, Blur, Weezer, Queens Of The Stone Age, Los Hermanos... Pra salvar seu estômago da congestão provocada por MPBistas e congêneres. Aparece lá.
PROMOÇÃO – MELHORES DO ANO
A eleição dos melhores do ano continua. Mande uma mensagem através da caixa "Contate o colunista", logo abaixo, elencando quais foram os três melhores discos do ano na sua opinião. Vale nacional ou internacional, de qualquer artista ou banda, desde que os discos tenham sido lançados em 2003. Quem enviar seu voto vai concorrer no sorteio de um prêmio: um pôster do White Stripes, com MC5 no verso, para você escolher qual lado quer pregar na parede do seu quarto. Não adianta mandar várias mensagens, cada leitor tem direito a apenas um voto. A lista dos melhores e o resultado da promoção saem na coluna da segunda sexta-feira de janeiro, dia 9 – portanto, você deve mandar sua mensagem até o meio-dia da véspera, dia 8. Não esqueça de colocar seu telefone pra contato e endereço completo.