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Respeitar tudo para desrespeitar tudo

11 jul 2003 às 15:12

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A afirmação é meio boba, mas faz sentido: é muito bom para a música brasileira que exista um grupo como o Domenico + 2. O trio carioca composto pelo baixista Kassin (ex-Acabou La Tequila, produtor do Los Hermanos), o baterista Domenico (ex-Mulheres Q Dizem Sim) e o guitarrista Moreno Veloso (sim, filho de quem você está pensando) tem idéias interessantes que chegam a ser geniais em alguns momentos - no próprio nome da banda, que era Moreno + 2 em 2000, no disco de estréia "Máquina de Escrever Música", e que portanto deve ser Kassin + 2 daqui a um par de anos.

Essa variação de alcunha, além de chamar a atenção, parece dar álibi para que o grupo soe totalmente diferente a cada disco. Se bem que "Sincerely Hot" (Ping Pong), que chega agora às lojas com distribuição nacional pela Trama, não é tão diferente assim do que o trio já apresentou anteriormente. A qualidade da música do Domenico + 2 reside no seu desprendimento em flertar com o experimentalismo ao mesmo tempo em que não renega o que há de mais ortodoxo na MPB, seja a bossa nova, o samba de raiz ou o balanço à Jorge Ben. E essa ficha parece que ainda não caiu pra muita gente.

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"Sincerely Hot" é um disco assumidamente esquizofrênico. Começa com a ótima "Alegria, Vai Lá", de batida travada e volumosa linha de baixo. O vocal, entoado com leveza, apenas varia sobre o título da música, e se encaixa mais como um instrumento do que sugerindo uma melodia assobiável. No meio, barulhos e efeitos. Não chega a formar uma canção, o que é genial - um disco de MPB que abre sem a paranóia brasileiríssima da harmonia perfeita, da melodia refinada.

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A faceta mais tradicional de Domenico + 2 aparece nas bossas "Aeroporto 77", com teclados lounge, "Possibilidade", que traz um arranjo de metais de sonho, e a entorpecida "Despedida", que, como sugere o título, encerra o disco. Também se apresenta no sambinha "Tarde de Chegada", que poderia ter sido assinado por tio Chico Buarque.

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Nestes momentos, "Sincerely Hot" quase passa por disco convencional, impressão que é desfeita quando a maluquice se manifesta. A preguiçosa "Comigo" traz um desajeitado dueto com uma voz feminina, decorada por uma graciosa linha de baixo. Começa simples, mas logo mergulha numa corrente de teclados sessentistas, vocoders e barulhos, como se a banda tentasse compor uma trilha sonora. A faixa-título soa como uma banda punk puxando uma roda de samba.


A ótima "Felizes Ficaremos na Estrada" deixa evidente a lógica amalucada do Domenico + 2: quando se respeita tudo, é possível desrespeitar tudo. Aqui, o grupo faz um soul tradicional, com vocais falados declamando a letra, antes de cair em agudos hilários. No meio, um debochado solo de guitar hero. Tão reverente quanto subversivo com a música negra americana.

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Se tudo o que foi citado anteriormente nesse texto dá motivos para que o indie mais cabeça dura não se arrisque em "Sincerely Hot" (alguém acha que o moleque que curte Nirvana vai comprar um disco da banda do filho de Caetano Veloso?), os MPBistas de direita também não devem se esforçar em conhecer Domenico + 2. Com certeza vão se espantar com "Você e Eu", rock pauleira que berra desesperadamente no refrão: "quero você e eu!" Musicalmente, está mais para Pixies do que para Tom Jobim.


Poucas vezes a utopia de mesclar música brasileira e ritmos estrangeiros a ponto de torná-los irreconhecíveis rendeu tão bem quanto em "Sincerely Hot". Dá para esperar com gosto por Kassin + 2.

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Lançamentos


Hot Hot Heat - "Make Up The Breakdown" (Sub Pop - importado) e "Scenes One Through Thirteen" (OHEV - importado)


O pop canadense rendeu tantas desgraças ao mundo (Celine Dion, Bryan Adams, Alanis Morissette) que o gélido país ao norte dos Estados Unidos já devia ter recebido alguma sanção da ONU. Nas últimas décadas, só salvaram a boiada Neil Young e Leonard Cohen. E o quarteto Hot Hot Heat. O grupo lançou no final do ano passado o excelente "Make Up The Breakdown", uma coleção enxuta de dez jóias pop. Misturando rock de garagem, new wave e power pop, o grupo oferece delícias como "Oh, Goddammit" e "Talk To Me, Dance With Me", com vocais que lembram Robert Smith, do Cure - até as choradinhas são as mesmas. Atrás de grana fácil, a OHEV, antiga gravadora do grupo, aproveitou a badalação em torno da banda e colocou no mercado "Scenes One...", coletânea que reúne os primeiros passos do Hot Hot Heat, com o cantor Matt Marnik. À parte a mal educada e divertida "Keep My Name Out Of Your Mouth", é rock garageiro gritão sem tino pop nem graça. Ainda bem que Marnik saiu.

Para quem gosta de: Weezer, Strokes, Bidê Ou Balde.


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