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Bem vindo aos anos 80

02 jul 2004 às 11:00
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O guitarrista John, do Pato Fu, certa vez apontou que o mecanismo da cultura rock segue a regra de sempre rejeitar o que foi produzido na década anterior e reciclar o que foi feito na retrasada. A teoria se traduz na prática quando se verifica, por exemplo, que nos anos 80 as bandas da new wave reaproveitaram o clima festeiro e descompromissado dos conjuntinhos dos anos 60, antes que o psicodelismo (que desembocaria no progressivo) transformasse o rock em coisa séria.

Nos anos 90, os grunges em sua maioria apenas imitaram o rock pesado dos 70 (Black Sabbath, Deep Purple, Led Zeppelin) ou o punk inglês 77 (Sex Pistols, especialmente) e teve gente que os achou originais. O mecanismo pode ser percebido na década atual, em que Hot Hot Heat se apropria da fase alegrinha do Cure, Interpol reinventa Joy Division (que se projetou no final dos anos 70, mas é identificado com a década seguinte) e Echo & The Bunnymen, Rapture estraga Gang Of Four e PiL, e assim por diante. Existem subsídios para dizer que o século XXI até agora é os anos 80.

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Pois 2004 tem confirmado essa tendência com gosto. Após o estouro do Franz Ferdinand e a volta de Morrissey, os recém-lançados álbuns do Cure e dos novatos Killers saúdam a década retrasada. O enésimo disco da banda que surgiu cantando que garotos não choram, simplesmente intitulado "The Cure" (Universal Music), prova que Robert Smith não consegue se livrar do monstro que criou. Afinal, a partir do final dos anos 90 e especialmente após o penúltimo disco inédito, o lamurioso "Bloodflowers" (2000), o veterano cantor inglês falou incessantemente em acabar com o grupo. No entanto, aqui está ele, assinando 11 canções novinhas em folha...

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A edição brasileira do disco, que chegou esta semana às lojas em lançamento simultâneo ao resto do mundo, é parecida com a americana: na sua primeira tiragem, traz como bônus um DVD com cenas da gravação do álbum. Quando foi anunciado no ano passado que Ross Robinson produziria o trabalho, a notícia foi recebida com natural estranheza e alguma galhofa pela imprensa – afinal, Robinson é o produtor padrão das terríveis bandas do new metal, como Limp Bizkit, Slipknot e Korn.

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Mas, excetuando-se alguns berros mais selvagens que são arrancados da garganta de Smith, a influência é imperceptível. O rock do Cure segue as mesmas nuances pós-punk, com teclados anacrônicos, linhas de baixo pronunciadas e guitarras esparsas, mas desta vez com teor menos melancólico em comparação a "Bloodflowers". O disco anterior se insinua na faixa de abertura, "Lost", miserável como só Robert Smith sabe ser, mas o restante do álbum não segue a mesma faceta desesperadora.


As tradicionais lindas baladinhas se destacam, caso de "Before Three", e "(I Don’t Know What’s Going) On". O primeiro single, "The End Of The World", se equilibra entre a euforia e a tristeza. A banda mostra músculos roqueiros mais nítidos em "Labyrinth", de refrão insistente, na quase agressiva "Never" e na ensolarada "Taking Off", todas dignas da produção de Smith nos anos 80. O que acaba diminuindo a média final de "The Cure" é uma seqüência pouco inspirada de faixas lá pelo miolo, mas dá-se um desconto: são poucos os grupos veteranos no rock atual que ainda conseguem fazer um disco que é ótimo em três quartos de sua duração.

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Se o Cure soa naturalmente oitentista, visto que está transitando em seu território, a banda norte-americana The Killers é um caso de inspiração quase simiesca. O grupo vem de Las Vegas, cidade que habita o imaginário da cultura pop mas não tem tradição em revelar nomes dentro do rock, e lança agora seu primeiro álbum, "Hot Fuss" (Lizard King – importado). É som datado e derivativo, mas não há porque torcer o nariz: o repertório é uma coletânea de hits em potencial, canções passíveis de rolar em alguma FM jabazeira sem estranhamento.


A influência de Duran Duran é nítida, tanto nos timbres quanto no apelo dançante e no misto de pose e entrega do vocalista Brandon Flowers. Podem ser percebidas também pitadas do bom tratamento melódico dos Smiths, e do clima entre a pista e a choradeira ao espelho de New Order, embora sem toques eletrônicos, e do próprio Cure, em sua fase mais pop. E, se falamos de pose, tem que haver um tanto de glam rock: a balada "Andy, You’re A Star", que permanece tensa a maior parte do tempo mas fecha em desavergonhada euforia, poderia estar em algum disco de David Bowie da primeira metade dos anos 70.

A banda arrebenta de saída com "Jenny Was A Friend Of Mine" e "Mr. Brightside", ambas tão fulgurantes quanto melancólicas, e com jeitão de hits planetários. Aí, você já está no embalo, e voltar é difícil. A única bola fora é "Glamorous Indie Rock & Roll", faixa que consta apenas da versão inglesa do disco, e que parece uma recriação infeliz de alguma balada da segunda fase dos Beatles (ou seja, é ruim como o Oasis). Mas é difícil exigir perfeição de um álbum de estréia.


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