Pesquisar

Canais

Serviços

Publicidade

Disputa doméstica

26 mar 2004 às 11:00
siga o Bonde no Google News!
Publicidade
Publicidade

Há cinco anos atrás, Courtney Love e a baixista Melissa Auf Der Maur compartilhavam o mesmo emprego: o Hole, bandinha que nasceu fazendo punk rock gritado e ruim que não teria ido além do circuito dos porões se Love não tivesse se casado com Kurt Cobain. A banda acabou em 2002, após lançar um ótimo terceiro álbum, "Celebrity Skin" (1998), que pouca gente ouviu. Á época, ninguém lamentou: afinal, agüentar pela imprensa as idas e vindas dos projetos de Love e sua extrema limitação na hora de conseguir fazer um disco com facilidade já tinham torrado a paciência dos fãs do Hole.

Antes mesmo do fim, Melissa já havia abandonado o barco. No final de 1999, ela decidiu sair do Hole para gravar um disco solo, mas na mesma semana em que anunciou sua despedida foi chamada por Billy Corgan para tocar na turnê de "Machina/The Machines Of God", último disco dos Smashing Pumpkins, que seria lançado no início do ano seguinte.

Cadastre-se em nossa newsletter

Publicidade
Publicidade


Após passar um ano nesse emprego, Melissa, sem pressa e com discrição, gestou seu álbum solo. Love, por sua vez, adotou a tática do barulho: se meteu numa disputa judicial com a gravadora do Hole, a Universal – envolvendo direitos sobre lançamentos póstumos do Nirvana -, tentou uma nova banda chamada Bastard que não foi além dos primeiros ensaios, arriscou uma carreira no cinema e, ao que parece, voltou a usar drogas. Prisões, audiências e internações voltaram a fazer parte de seu cotidiano.

Leia mais:

Imagem de destaque

Prêmio de consolação

Imagem de destaque

Semestre gordo

Imagem de destaque

Sem má vontade

Imagem de destaque

Item obrigatório


É aquele famoso clichê de trajetórias que se separam, mas que por destino acabam se tangenciando novamente: coincidentemente, os primeiros discos solo de Love e Melissa chegam simultaneamente às lojas agora – Brasil incluso, via EMI. A viúva de Cobain saca "America’s Sweetheart", que, apesar de anunciado há anos, foi completado a toque de caixa. Boatos dão conta de que Love teria gravado os últimos vocais do álbum menos de um mês antes do trabalho chegar às lojas. Melissa lança um disco cujo título é seu sobrenome.

Publicidade


Love sempre teve fama de não ter uma molécula minimamente musical em seu corpo inteiro. Na única vez em que ela teria conseguido compor alguma coisa sozinha, saiu "Pretty On The Inside" (1991), o terrível primeiro disco do Hole. No milionário "Live Through This" (94), Love teria tido uma ajudinha do marido, enquanto "Celebrity Skin" teria sido escrito por Billy Corgan.


Reforçando a tese, Love só conseguiu fechar "America’s Sweetheart" com caridade de terceiros: a compositora Linda Perry seria a ghost writer da vez, com Bernie Taupin, letrista de Elton John (!), colaborando em algumas faixas. Se você forçar a memória, vai lembrar quem é Perry – ela liderou, no início da década passada, uma banda horrenda chamada 4 Non Blondes, que emplacou o igualmente horrendo hit "What’s Up". Aquele do "and I say, heeeeeeeeeeyyyy, yeah, yeah, yeah..." Depois do abençoado fim de sua banda, Perry virou compositora profissional, especializada em escrever sucessos. Christina Aguilera e Pink estão entre suas clientes.

Publicidade


No fim das contas, "America’s Sweetheart" não escapa desse espectro de feito-para-vender típico das discípulas de Perry. O disco abre com um roquinho pretensamente bombástico, "Mono", no qual Love questiona: "você sentiram minha falta?", em alusão ao parto que foi a confecção do disco. Desculpa, Courtney, não sentimos, não.


Love não tem receios de demonstrar que é uma letrista que não consegue (não quer?) se arriscar, já que o disco inteiro versa apenas sobre seus dois assuntos favoritos: ela mesma e rock’n roll. Em "But Julian I’m A Little Older Than You", ela tenta pateticamente demonstrar que tem alguma relação com o povo do novo rock, ao citar o vocalista dos Strokes. Na já citada "Mono", ela avisa que veio "salvar o dia". Com momentos odiosos de pretensão como esses, mesmo versos que deveriam ser apenas irônicos, como "eu sou o centro do universo" ("Hold On To Me"), acabam adquirindo sentidos literais de egocentrismo.

Publicidade


Musicalmente, "America’s Sweetheart" fica sempre entre a balada e o rock, no ponto para tocar no rádio, e tem faixas muito parecidas entre si. É apenas passável e em momento algum desperta vontade de apertar o play uma segunda vez, e por vezes cai na tortura pura. Como acontece no final de "Sunset Strip", com vários vocais sobrepostos, e nos berros de "The Plague" – se a voz de Love já irrita quando ela acerta o tom, imagine quando ela está chapada e decide ir ao estúdio gravar alguma coisa... Se houvesse alguma expectativa, "America’s Sweetheart" poderia ser considerado o fracasso do ano. Mas quem se importa com o fato de que Courtney Love ainda existe?


Só de olhar os nomes no encarte já dá pra perceber que "Auf Der Maur", de Melissa, é bem melhor. Ao invés de Linda Perry, colaboram bambas como Josh Homme, do Queens Of The Stone Age, James Iha, ex-Smashing Pumpkins, Eric Erlandson, ex-Hole, Mark Lanegan, Brandt Bjork, ex-Kyuss... É bom lembrar que no peito de Melissa bate um coração headbanger: após sua saída do Hole, a moça até formou uma banda que tocava apenas clássicos do Black Sabbath, chamada Hand Of Doom.

Publicidade


Melissa junta melodias extremamente pop e guitarras pesadas, mas que não chegam a soar metaleiras, salpicadas com um certo sabor gótico. "Lightning Is My Girl", por exemplo, parece um Siouxsie & The Banshees repaginado. O primeiro single, "Followed The Waves", é anunciado pelo timbre inconfundível da guitarra de Homme, e é um dos destaques do CD, ao lado dos refrões aderentes de "Real A Lie" (poderia tocar no rádio sem susto) e de "I’ll Be Anything You Want", e da melancolia de "Would If I Could".


"Auf Der Maur" infelizmente padece de dois problemas típicos de disco de estréia: em primeiro lugar, é um trabalho desigual, com um bolo de faixas menos inspiradas lá pelo meio; segundo, Melissa ainda precisa melhorar nos vocais, pois, apesar de não desafinar, a moça não vai muito além do óbvio. Mas se trata de um álbum que sinaliza o brilho próprio que a carreira solo de Melissa pode ter. Na disputa doméstica, ela já dá de goleada na ex-patroa.

Publicidade


LANÇAMENTOS


Natural History – "Beat Beat Heartbeat" (Star Time - importado)

Publicidade


Este trio nova-iorquino alcançou alguma repercussão ao ser uma das bandas presentes na coletânea "Yes New York" (que saiu no Brasil), na qual compareciam com "The Right Hand" – faixa incluída neste álbum de estréia. O Natural History, liderado pelos irmãos Max (vocais, guitarra) e Julian Tepper (baixo), segue à risca a receita Strokes de preguiça: apresenta apenas onze canções, que no total não perfazem nem meia hora. Simples, garageiro e com aquela cara de "novo" rock, "Beat Beat Heartbeat" é divertido e sua força reside nas melodias, que remediam a recorrência de timbres e arranjos e a similaridade entre as canções. A cadenciada "Broken Language" e a última faixa, "Dance Steps", que rememora os anos 80, se destacam da manada.
Para quem gosta de: Primeiros discos de Elvis Costello, The Jam, Strokes.


Gram – "Gram" (Independente)

Banda paulistana que surgiu de outro conjunto que tocava apenas músicas em inglês (Mosva) e de uma banda cover dos Beatles (Beatless), o Gram alega que decidiu começar a cantar em português depois de "Bloco do Eu Sozinho", do Los Hermanos. As referências fazem sentido – as melodias são bem trabalhadas e nitidamente inspiradas nos Fab Four, e as letras de amor derramadas devem tudo a Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante – e ainda ganham um reforço: o Radiohead fase "The Bends", na melancolia desmensurada e na dinâmica e nos timbres das guitarras. Saudado como salvação por alguns indies mais afoitos, este primeiro álbum tem faixas de qualidade, como "Você Pode Ir Na Janela" e "Faça Alguma Coisa", e está acima da média do pop nacional, mas às vezes o excesso de choradeira enjoa.
Para comprar: http://gram.mosva.com.br.
Para quem gosta de: Radiohead fase "The Bends", faixas mais roqueiras dos Los Hermanos, Travis.


Publicidade

Últimas notícias

Publicidade