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Made In Texas

04 jul 2003 às 10:59

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Considerando-se a geografia da sua árvore genealógica, o rock nasceu nos Estados Unidos, mais ou menos às margens do Mississipi, virou mania a partir de Londres e Liverpool e começou a ser subvertido a partir de Detroit, quando no final dos anos 60 os Stooges criaram o punk antes que qualquer outro moicano reivindicasse o feito. A partir dos Ramones, de Nova Iorque, o subgênero encontrou sua cara - que foi ainda mais apimentado via São Francisco, quando no começo dos anos 80 os Dead Kennedys popularizaram o hardcore.

Todas essas vertentes do que há de mais insano no rock encontraram lar seguro no estado americano do Texas, que, do chatíssimo Pantera a George W. Bush, sempre foi pródigo em pauleira. A lista, extensa, passa por Reverend Horton Heat e Butthole Surfers e chega até a novíssima safra, que há três anos foi alvo de intenso hype da imprensa inglesa, quando os novos discos de At The Drive-In e ...And You Will Know Us By The Trail Of Dead chegaram às lojas.

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Hoje, embora não haja mais a badalação de outrora, o barulho texano continua mostrando serviço. Num espaço de tempo relativamente curto, saíram no exterior os trabalhos mais recentes do Trail Of Dead, do Mars Volta e do Sparta - estas últimas as duas bandas que surgiram da separação do At The Drive-In, no primeiro semestre de 2001. Nenhum deles tem data para sair no Brasil.

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Quando decidiu implodir, o At The Drive-In estava correndo o sério risco de virar banda grande. Tinha soltado poucos meses antes o soberbo "Relationship Of Command" (2000, com edição nacional pela Virgin), o mais explosivo item do catálogo da punk texano, com tijoladas que misturavam (alguma) psicodelia, (várias) quebradas de andamento, (muito) peso e (muuuuuita) gritaria. O single "One Armed Scissor" ganhou a MTV americana, e quando a banda estava prestes a ganhar muito dinheiro, os cabeças do monstro, Cedric Bixler (vocalista) e Omar Rodriguez (guitarra), decidiram sair.

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Em seguida, os dois montaram outra banda, o Mars Volta, com chegados de El Paso, cidade na fronteira com o México. Os outros três integrantes do At The Drive-In, Jim Ward (guitarra), Paul Hinojos (baixo) e Tony Hajjar (bateria), agregaram mais um músico e formaram o Sparta. A segunda banda saiu na frente, lançando no segundo semestre do ano passado "Wiretap Scars" (Dreamworks). Na semana passada, chegou às lojas americanas a estréia do Mars Volta, "De-Loused In The Comatorium" (Universal).


O fã do At The Drive-In poderia comemorar o fato de que agora tem duas bandas favoritas, mas não foi bem o que aconteceu. O álbum do Sparta abre de forma promissora, com "Cut Your Ribbon", rockinho potente que poderia ter entrado como lado b em algum single da banda mãe. Mas, assim como o próprio At The Drive-In tinha um pezinho no emocore, "Wiretap Scars" se perde nas lamúrias.

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O resto do disco é choradeira de mais e porrada de menos. A melancólica "Air", apesar de boazinha, lembra demais o Blink 182 (arre!) quando o trio engraçadinho decide ser introspectivo - até o produtor é o mesmo, Jerry Finn. "Cataract" não só é auto-piedosa como ainda chupa a introdução de "Invalid Litter Dept.", do próprio At The Drive-In. Às vezes, pinta um barulhinho bom, em "Mye" e "Sans Cosm", ou uma canção pop competente, como em "Light Burns Clear". Mas falta sal.


Já a "De-Loused In The Comatorium" o que não falta é tempero, tanto que a receita desandou. A produção é de Rick Rubin, que já pilotou a mesa de som de famosos como Slayer e Red Hot Chili Peppers, o disco tem participação de Flea e John Frusciante, do próprio Red Hot, mas... Não vai ser sucesso. O Mars Volta faz um coquetel incompreensível e por vezes indigesto de hardcore, heavy metal melódico, jazz e rock progressivo. Com ênfase neste último - as músicas são longuíssimas.

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Segundo Bixler, o disco é uma obra conceitual sobre a vida de Julio Venegas, artista de El Paso que se suicidou em 1996 e que é a vítima do coma do título do álbum. E, você sabe, não existe nada mais progressivo do que disco com historinha. Assim como no Sparta, o Mars Volta soa mais empolgante quando lembra o At The Drive-In, como nas porradas "Inertiatic ESP" e "Take The Veil Cerpin Taxt". Mas quase nunca o grupo soa tão direto - dá-lhe efeitinhos, paradas, solos de guitarra. Afinal, fazer música que muda o tempo todo é mais fácil do que escrever canções redondas.


Apesar da viagem de guitar hero (ouça o solo à David Gilmour da boa "Roulette Dares"), Rodriguez quase consegue salvar o barco, ao contrário de Bixler. O vocalista está cantando no tom, afinadíssimo, o que é uma lástima, já que um dos grandes prazeres de ouvir um disco do At The Drive-In era ser atormentado pelos berros psicóticos do moço. Bixler chega a lembrar o timbre de gente que você fazia questão de esquecer, como André Mattos, ex-Angra, e o resto da galera do heavy melódico. Há espaço até para baladinha para comercial de cigarro, a constrangedora "Televators".

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Um crítico americano foi feliz ao constatar que a porção direta do At The Drive-In ficou com o Sparta, enquanto o Mars Volta deixou a maluquice fluir. É como se Ward, Hinojos e Hajjar segurassem o tempo todo para que Bixler e Rodriguez não viajassem em excesso na maionese. Desse jeito, companheiro, você não só perdeu uma banda, como deixou de ganhar duas. Resumo da novela: revival já, pessoal.


Já com o Trail Of Dead não tem susto. O quarteto de Austin lançou no último dia da mentira o EP "The Secret Of Elena’s Tomb" (Interscope), sucessor do excelente "Source Tags & Codes" (2002). A exemplo do álbum do Mars Volta, o disquinho de cinco faixas também seria conceitual - versa sobre a história supostamente verídica de um cientista que tentou por oito anos ressuscitar uma paciente morta por tuberculose em 1931, Elena Hoyos.


Mas as músicas não deixam escapar nenhuma ponta de pretensão. O Trail Of Dead é acusado constantemente de imitar o Sonic Youth, mas não parece se importar com isso. Caso se importasse, não abriria um disco com algo como "Mach Schau", parecidíssima com qualquer faixa porrada que Thurston Moore tenha cantado entre 1987 e 1992, ou plagiado o riff de "Dirty Boots" para decorar "All Saints Day". Mas quem quer saber de originalidade?

Na hora do vamos ver, o Trail Of Dead prova porque entra em qualquer lista das melhores bandas da atualidade. Fazem barulho de gente grande em "All Saints Day", que apesar da "citação" é excelente, chorinho do bom em "Crowning Of A Heart" e "Counting Off The Days", e usam pela primeira vez efeitos eletrônicos na bombástica "Intelligence". Meio disco destes moleques está valendo mais que álbuns cheios de Sparta e Mars Volta somados.


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