Das bandas americanas incensadas recentemente pela crítica inglesa (leia-se Queens Of The Stone Age, At The Drive-In, ...Trail Of Dead, Strokes, White Stripes, Interpol), o trio nova-iorquino Yeah Yeah Yeahs é indiscutivelmente o mais fraco.
Quem der uma orelhada nas onze faixas (mais uma secreta) de "Fever To Tell" (FNM/Universal), álbum de estréia do grupo que sai este mês no Brasil, vai se perguntar se o problema do rock atual é realmente a saturação do gênero (como alguns jornalistas acusam) ou se pirou o cabeção do pessoal que escreve para os tablóides britânicos.
O fetiche da vez é a vocalista Karen O, que anda conquistando jornalistas gonzos com gritinhos, pulos ao chão durante os shows e um sex appeal, digamos, pouco convencional. Esta semana, a moça anunciou que recusou convites para posar nua para a Playboy. Ela é escudada pela bateria de Brian Chase e a guitarra de Nick Zinner – a banda não tem baixista.
O trio lançou dois EPs independentes insuportavelmente altos, dos quais é impossível tirar uma melodia aproveitável, mas foram estes dois disquinhos que chamaram a atenção da imprensa britânica no ano passado. Nos Estados Unidos, assinaram com a gigante Interscope, que já havia cooptado o Queens e o Trail Of Dead, e que lança os trabalhos de Eminem.
"Fever To Tell" é uma coleção superior a tudo o que a banda fez antes, o que não significa que seja grande coisa. Em certos números, os Yeah Yeah Yeahs chegam muito perto de compor algo próximo a uma canção, o que, se não justifica a badalação obscena da qual são alvo, pelo menos lhe dão o status de conjunto promissor.
Nos poucos menos de 40 minutos do disco, a banda quase sempre reafirma sua paixão pelo rock de garagem e o punk ortodoxo, pelos vieses Jon Spencer Blues Explosion e Stooges da história. A voz de Karen parece uma mistura dos gogós de Chrissie Hynde, dos Pretenders, de Siouxsie Sioux e da fase bêbada de PJ Harvey.
Dessa receita, surgem boas idéias, mas ora a vocalista, ora os meninos da guitarra e da bateria tratam de estragar alguma coisa. Na suingada "Black Tongue", Karen testa a paciência do ouvinte com "a-han"s intermináveis, assim como nas brincadeiras sem graça de "Tick". Chase e Zinner dão o troco em "Cold Light", onde despertam bocejos com uma coleção de batidas e riffs arrastadões.
Às vezes, a banda se entende e trata de estragar tudo junta, como no "refrão" martelado de "Date With The Night", ou em "No No No", onde fazem pop certinho nos primeiros minutos, antes de caírem numa psicodelia de quinta.
Os Yeah Yeah Yeahs cometem com freqüência o pecado de acreditar que um punhado de riffs justapostos com alguém gritando em cima forma uma canção. Mas não sejamos de todo ranhetas – "Man", que emula à exaustão o combo gritão de Jon Spencer, é uma graça, e "Pin", que coloca Chrissie Hynde cantando nos Strokes, também é uma brasa. Mas a melhor porção do álbum está no final, quando os Yeah Yeah Yeahs quase justificam a aquisição de "Fever To Tell".
A bonitinha "Maps" puxa uma trinca de faixas redondas, que dá uma pinta da boa banda que a turma de Karen O poderia ser se não tivesse cabulado algumas aulas de guitarra. A primeira pinça riffs saturados e ecos, para que a moça repita o refrão mântrico de forma lânguida: "eles não te amam como eu te amo". Uma jóia. A seguinte, "Y Control", a melhor música do disco, recupera a pauleira do resto do álbum, mas agora com jeitão pop e a serviço de uma melodia decente. Rola em qualquer festa indie sem atormentar ninguém.
O trio fecha o disco com educação, na bela e simplória "Modern Romance", com sininhos e uma guitarra palhetada preguiçosamente, praticamente uma canção de ninar. A faixa secreta, tocada e cantada com igual leseira, chega a lembrar Chan Marshall, do Cat Power.
Seja tocando a maior podreira, não existe banda no mundo que viva sem canções minimamente decentes. Os Yeah Yeah Yeahs parecem estar no rumo para aprender isso. Talvez um dia eles sejam tão bons quanto andam falando.