A criança perde a fome, o sono, não conversa, não brinca. Vive amedrontada e um toque ou carinho é rapidamente rejeitado. Isolados, esses comportamentos podem não dizer muito, mas se você percebe uma mudança brusca de atitudes em seu filho, sem nada que justifique, atenção. Ele pode ser vítima de abuso sexual.
Quando se fala em pedofilia o primeiro sentimento natural é a aversão, compaixão para com a vítima e o repúdio ao agressor. Mas, e quando esse crime acontece em casa, no ambiente familiar, praticado por aqueles que deveriam ser responsáveis pela criança?
''Quando o crime acontece além das fronteiras dos laços de sangue a revelação choca. Mas choca muito mais quando se descobre que foi o pai, um tio ou o avô. A criança não sabe em quem confiar e o segredo que o agressor lhe exige se torna um fardo maior que sua mente infantil possa processar'', explica a psicóloga Alessandra Rocha Santos Silva.
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Ela é uma das profissionais que atendem no Centro de Referência Especializado em Assistência Social (Creas) de Londrina, na unidade que atua com atendimento psicossocial de crianças vítimas de violência. O trabalho visa descobrir se houve agressão e como evitar possíveis reincidências.
Quando a mãe, a avó ou outro responsável procura o Conselho Tutelar para denunciar um abuso, a criança é encaminhada para o Creas. ''Nós contextualizamos o caso e, com a ajuda da criança, buscamos diagnosticar o que é violência e pedofilia. Como se faz isto? Através de atividades lúdicas, brincadeiras e historinhas, levamos a criança a relatar como foi a agressão que sofreu e quem a vitimizou'', explica Alessandra.
O consultório onde é feito esse procedimento é equipado com bonecos que simulam a anatomia humana e a criança vítima de abuso não se intimida em brincar com esse material. Segundo a psicóloga, uma criança que não sofreu abuso se assusta com os ''brinquedos'', já a que foi vitimizada brinca porque a temática já passou a fazer parte de seu universo.
Desde o início do ano foram 965 os casos atendidos no Creas, número considerado alto pelos profissionais. Segundo a psicóloga, o grande problema quando o abuso sexual acontece por familiares é que as pessoas mais velhas tendem a minimizar o assunto por medo das consequências que a revelação traria.
Alessandra traduz toda a fragilidade da criança contando que já atenderam crianças que usavam mais de uma calça para dormir, com medo de serem molestadas. ''Passavam a noite em estado de alerta. Muitos responsáveis se omitem em suas obrigações de romper com essa crueldade. Há quem exija silêncio dos filhos tanto quanto os agressores. O medo da reação do pedófilo e da exposição da família a um processo judicial cala os que deviam ser promotores do bem estar da criança.''
Muitos casos de pedofilia familiar são denunciados por professores, tios, avós e vizinhos. Para essas pessoas os sinais são mais evidentes, as crianças fazem brincadeiras e desenhos com cunho sexual. As conversas das crianças repetem palavras ouvidas quando foram molestadas. Ao mesmo tempo, mostram grande interesse pelo assunto. Os mais novos expõem a prática da masturbação, pela estimulação que viveram.
''Hoje se fala muito da pedofilia que alguns padres católicos cometeram. Quando assim acontece é mais fácil de denunciar, porque é uma pessoa que não mora com a família e é fácil romper o convívio. Isso também quando o agressor é um vizinho ou desconhecido. Mas quando é o padrasto, a mãe que não quer perder o marido, ignora. Há também mulheres que foram vítimas, quando menores, e a posição da época, de pôr o dedo na frente da boca e exigir silêncio, permanece em suas consciências. Só quando se quebra esse ciclo é que a pessoa pode voltar a ser feliz'', explica Alessandra.
Exames podem confirmar queixa da criança
Quando detectar mais de um dos comportamentos indicativos e a família avaliar que está acontecendo abuso, o primeiro passo é procurar o Conselho Tutelar, que encaminhará o caso para o Creas. O atendimento psicológico vai ajudar a criança ou adolescente a expressar o que está acontecendo e, para confirmar a violência, é feito o exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML).
Segundo Fernando Piccinin, chefe do instituto, diariamente são feitos exames para verificar se alguma criança foi vítima de abuso. Não há uma classe social que seja privilegiada, todas estão sujeitas.
''Verificamos nos exames a presença de esperma, saliva, pelos pubianos, lesões e fissuras. Pode ser feito também o teste para verificar se foi rompido o hímen. O procedimento é um mal necessário, pois é o meio que temos para poder, pela lei, romper com as reincidências.''