Os professores João Antonio Cyrino Zequi, do departamento de Biologia Animal e Vegetal, e Karen Brajão de Oliveira, do departamento de Ciências Patológicas, ambos do CCB (Centro de Ciências Biológicas ) da UEL (Universidade Estadual de Londrina), comentam a respeito da vacina contra a dengue, Qdenga, desenvolvida pela Biofarmacêutica Takeda, do Japão, disponível no Brasil. Para os pesquisadores, o novo imunizante, apesar de ser bastante eficaz contra a doença (conforme testes clínicos, oferece eficácia de cerca de 80%, após a segunda aplicação, em um período de 30 dias a 12 meses), ainda não descarta os cuidados que a população deve continuar contra a proliferação da doença.
Os dados seguem altos em Londrina. De acordo com a última atualização, da última quarta-feira (5), o município apresenta 60.040 casos notificados, 31.173 casos positivos, 10.771 casos descartados, 18.096 casos em análise e 29 óbitos. Os dados são da Coordenação do Controle de Endemias, da Secretaria Municipal de Saúde de Londrina.
Pesquisador do Laboratório de Entomologia Médica, o professor João Zequi lembra que Londrina propicia cenários diferentes em suas regiões com relação à proliferação do vetor. “Exemplo são regiões em que existem maior concentração de pessoas em situação de acumulação, fatores que propiciam o início do aumento da incidência de casos, sendo assim neste ano o início se deu na região Norte”, diz. Por isso, enfatiza que por mais que as ações sejam realizadas periodicamente, é extremamente importante conscientizar a população para evitar locais propícios à proliferação do vetor. Isso inclui mudanças culturais, principalmente em relação do descarte correto dos resíduos.
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Zequi comenta que a sazonalidade influencia, mas o cuidado deve ser mantido em todas as estações. “Há também o aspecto imunidade. Se em um determinado local as pessoas estão imunes a um determinado sorotipo de vírus dengue, por exemplo, e se estiver circulando somente este, você pode ter muito mosquito, mas poucos casos devido à imunidade das pessoas, ou até baixa infestação de mosquito, mas se estiver com sorotipo novo haverá mais casos da doença”, explana. Segundo o pesquisador, a dinâmica entre a presença do vetor, circulação viral e doentes envolve muitos fatores e atores, por isso é crucial o monitoramento do vetor e dos vírus circulantes para uma ação mais eficaz.
Vacina atenuada
Mestre e doutora em Patologia Experimental, e pesquisadora do Laboratório de Genética Molecular e Imunologia, a cientista Karen Brajão pontua que se trata de uma vacina atenuada, ou seja, que traz em sua composição microrganismos vivos. É o único imunizante contra a dengue aprovada no Brasil, pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), para utilização em indivíduos sem necessidade de teste pré-vacinação - o que significa que pessoas que já tiveram ou não a doença podem se vacinar. No entanto, por ser atenuada, não é recomendável a pessoas com baixa imunidade, por doença ou tratamento. Por exemplo, portadores de HIV/AIDS, pacientes pós-transplante ou gestantes.
Brajão frisa que o tempo para chegar a uma vacina depende de vários fatores, desde os recursos investidos em pesquisa até o próprio comportamento da doença. No caso da Covid-19, por exemplo, a rápida transmissão permitiu observar melhor a doença em um tempo menor. “É preciso um tempo de avaliação”, observa.
A vacina se baseia em resultados de 19 estudos com mais de 28.000 crianças e adultos, que duraram cinco anos, e foi aprovada pela Anvisa para a faixa etária de 4 a 60 anos. É a primeira aprovação da Qdenga na América Latina. Por enquanto, está disponível apenas na rede privada. Não há previsão para chegar à rede pública. A professora informa que a vacina prevê duas doses subscutâneas.
Prevenção continua
Um ponto importante destacado pela pesquisadora é que a existência de uma vacina não é desculpa para as pessoas relaxarem nos cuidados preventivos, principalmente a limpeza. Isso porque lixo acumulado não atrai apenas mosquitos, mas outras espécies nocivas, como baratas, escorpiões e ratos. Além disso, ela lembra que o Aedes aegypti não transmite apenas a dengue, mas outras doenças como a zika e a chikungunya, para as quais ainda não há vacina.
Zequi vai na mesma direção. “A vacina é mais uma importante ferramenta de controle da propagação do vírus da dengue, porém se faz necessário manter a ações de controle entomológico devido a existência de outras arboviroses como a chikungunya e Zika, além de outros potenciais arbovírus que o Aedes pode futuramente veicular. O monitoramento do vetor e seus arbovírus precisam ser constantes, pois a vacina tem como foco somente os quatro sorotipos de dengue, o que já é um grande avanço”, frisa.
Quem compartilha da mesma opinião é o coordenador de Controle de Endemias de Londrina, Nino Medeiros Ribas. Para Zéqui e Ribas, é importante esclarecer outros pontos, como o uso de repelente e o “fumacê”, tidos como “soluções” para parte da população. “O uso de repelente de forma correta, é uma ferramenta que pode sim influenciar diretamente tanto nos dois ciclos de transmissão, intrínseco (homem) e extrínseco (mosquito). A ferramenta conhecida com UBV Pesada, o “fumacê”, é uma das orientações para o controle de epidemias sustentada, ou seja, o aumento na incidência de casos prováveis em um curto espaço de tempo, porém se faz necessário destacar que é um inseticida”, informam. O que eles querem dizer é que mais de 50% de mosquitos são resistentes ou tolerantes a ele, ou menos afetados. Por isso, o uso precisa ser criterioso e acompanhado por outras atividades para que a resposta seja eficaz.