Muitas mães são desmotivadas a seguir na carreira após a chegada dos filhos. Dados da pesquisa Bem-Estar Parental (2023), realizada pela Filhos no Currículo e a Infojobs sobre os desafios da parentalidade na carreira, apontam que 55% de pais e mães já sofreram preconceitos ou retaliações no trabalho ou em processos seletivos.
Para Fernanda Nunes, atleta olímpica de Remo, frases como "Você tem até potencial, mas sendo mãe solo é difícil chegar lá” e “O seu filho é problema seu” foram faladas pelos treinadores antes das seletivas para os Jogos Rio 2016, quando disputou na categoria double skiff peso leve, com Vanessa Cozzim, outra mãe.
Antes da seletiva de 2012, Fernanda descobriu uma gravidez não planejada. Com seu filho, Bento, já com 3 anos de idade, a situação se repetiu. Assim, a atleta teve uma interrupção na crescente de treinamentos e na conquistas de novos marcos e tempos.
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O que era para ser uma parada forçada de quem estava tentando “equilibrar os pratinhos”, entre o trabalho de fisioterapeuta e os treinos iniciados às 5 horas da manhã, se transformou em uma maratona. Fernanda conseguiu participar das seletivas até a sexta semana de gestação.
No retorno da sua licença, com pouca rede de apoio, levava Bento para os treinos e recebia ajuda dos colegas, que se revezavam para dar o colo. Entretanto, na parte da comissão técnica, a atleta recebeu propostas para competições mais amadores e frases de desmotivação.
"Houve um desmerecimento ali. Mas, com a maternidade, me tornei uma pessoa mais focada, resoluta, resiliente e muito mais difícil de ser vencida”, conta a atleta, que vem colecionando medalhas, além de integrar a comissão de atletas do Comitê Olímpico Brasileiro desde 2020.
A CEO da Filhos no Currículo, michelle Terni, explica que não é só no esporte que os talentos femininos são expulsos após a maternidade. "No mercado de trabalho, mulheres são arrastadas para fora da arena na medida em que chegam os filhos em suas vidas, como se passassem a performar menos. O que acontece é o contrário. Filhos são potência na carreira. Ao invés de perda de performance, essa profissional retorna ao trabalho com habilidades extras adquiridas no exercício de sua maternidade", explica.
Ao comparar as regras para as carreiras, percebe-se que o que se aplica para as mães não é o mesmo que se aplica aos pais, começando pela licença maternidade versus licença paternidade "Em ano de Olimpíadas, é preciso levar essa discussão para os corredores corporativos", completa Michelle.
Fernanda e Vanessa Cozzi nos jogos Rio 2016. Créditos: Divulgação
Para a ginasta olímpica Gabrielle Moraes, tetracampeã pan-americana e medalhista na Copa do Mundo, conta que o apio da liderança a auxiliou na transição de sua carreira ainda dentro do esporte. Quando ela descobriu a gravidez, sendo titular de duas coregografias e faltando uma semana para a sua primeira Copa do Mundo, correu para a casa de sua técnica, chorando.
“Ela simplesmente olhou para mim e disse: ‘Você está grávida e está tudo bem. Vai ser o maior amor do mundo e mais uma fase que vamos viver juntas’”, relata.
Gabrielle menciona que pôde escolher entre continuar treinando e adaptar sua vida de atleta à maternidade ou passar a compor a equipe técnica, que precisava de reforços. Com 20 anos de carreira, iniciados aos seis anos de idade, viu ali uma oportunidade.
"Já estava completamente realizada como atleta, com várias medalhas conquistadas, principalmente no meu auge, que foram as Olimpíadas do Rio. Vi na comissão uma oportunidade de conciliar melhor a carreira com a maternidade”, explica Gabrielle.
Quando a atleta mencionou o desejo de procurar uma creche após seu retorno da licença maternidade, sua técnica insistiu que ela levasse sua filha para o ginásio. "Traga para o ginásio que a gente dá um jeito, colo sempre vai ter, ajuda sempre vai ter”.
Gabrielle relata que esse apoio foi o que a fez se sentir mais leve e segura em saber que poderia voltar a trabalhar, mesmo com uma filha pequena. "Ser mãe nos faz chegar ao pico da exaustão, do cansaço e da privação de sono, mas minha vida não parou depois que Manu nasceu, pelo contrário, me fez alçar voos ainda mais altos”, completa.
O levantamento feito sobre o Bem-Estar Paramental identificou que 78% dos entrevistados se dizem mais engajados e compromissados à medida que a empresa respeita seu papel como pai ou mãe, assim, Michelle salienta que levar os filhos para o trabalho pode não ser a realidade da maioria, mas receber apoio e acolhimento da liderança deveria ser.
“Aliás, liderança acolhedora é um dos requisitos mais desejados pelos profissionais com filhos. Há uma mina de ouro nas mãos desses líderes, que nem sempre estão preparados para reconhecer e impulsionar esses talentos”, enfatiza a CEO.
Gabrielle Moraes e a filha, Manu, no ginásio. Créditos: Divulgação